100nada

Hipermercado / auricular / consulta literária

– Olha lá já leste o livro do José Rodrigo dos Santos?
– Eu não e tu?
– Eu também não.
– E estás a perguntar porquê?
– É que ele está ali a dar autógrafos.
– E então?
– E então queria saber se era bom.
– Não faço ideia. Não conheço ninguém que o tenha lido.
– Nem eu. Se calhar ninguém leu…

(e depois, ao ver a fila que ali se organizou, fiquei a pensar quantos daqueles que o apresentaram ao autor para o assinar, o iriam ler – que querem, faz-me confusão esta coisa dos autógrafos nos hipermercados)


Heather Small

Gostava de aproveitar este momento de extraordinário luxo e total fuga às minhas próprias regras (fumar dentro de casa) para escrever uma coisa daquelas inspiradíssimas. Mas (caneco) o segredo não está na nicotina.

Gosto mesmo muito de M People, da voz desta mulher

é uma coisa de estarrecer. Não.
É uma coisa de estremecer. De tremer.

(imagem do site Positive Hope)





E o que a gente gosta de pirosadas nestas alturas!

Há qualquer coisa de profundamente imbecil em fumar
abrir parênteses há várias coisas imbecis, uma delas é fumar, fechar parênteses
em fumar, dizia eu, escrevia eu, digo, escrevo digo, escrevo escrevo, bolas!
em fumar um cigarro lá fora
abrir parênteses há várias coisas imbecis, uma delas é vestir um casacão e ir para o frio fumar, fechar parênteses
encontro o inverno nos meus dedos gelados (abrir àparte é prosa desta? isto é prosa da treta, fechar àparte)
fumar um cigarro lá fora e quase
quase mas faltando o quase, claro
(que há sempre uma parte a rir de tudo isso)
quase me emocionar a ver
a ficar a olhar já de cigarro apagado
para um pinheiro indescritivelmente iluminado
coisa mais pirosa não há
pinheiro enorme num jardim, fios de luz amarelos e vermelhos entrelaçados
azuis também
luzinhas mais fracas que acendem e apagam pela árvore toda
uma estrela de luz dourada no cimo
piroso piroso de fugir
jamais em tempo algum alguém teria aquilo no seu próprio jardim
mas
é
só de uma certa forma evidentemente, só de uma certa maneira de ver que a outra parte continua a rir disso
bonito.
é bonito. Aquela porcaria não pode ser mais feia mas é bonita.
Ou então sou eu, cheia de espírito natalício (estou a embotar o gume, é o que é).
Tá um frio lá fora que faxavor.


a Troca de Galhardetes que deveria ser por email mas não é

Catarina!
Em resposta a algumas insinuações que se seguiram, gostava de lhe dizer que quando falei na clientela fiel, tentei ser simpático, e era evidentemente uma brincadeira ao seu post anterior. Parece no entanto, que as bloggers deste pequeno Portugal, estão de pança cheia, acomodadas e inchadas sem sequer se perceber o porquê, visto a maioria, nada fazer para merecer a continuidade das visitas que continuam a ter, excepto, o usarem e abusarem do Português vernáculo, que parece vai dando frutos neste meio, cada vez mais pejado de bicéfalos anácronos, aliás, blog de gaja, parece que tem de ser assim, exceptuando algumas, poucas, que usando o método, escrevem no entanto bem pr´a caralho.
A Catarina pode “espetar” o que quiser no seu blog, não tem é depois o direito de querer que as pessoas comentem cada merda que diz. O gado ainda não é assim tanto, e se aqui vimos é porque já lemos muito bom texto por cá e gostávamos de continuar a ler, mas como diz, o blog é seu, pois bem, fique com ele.
Espero que o mau feitio lhe passe, pelo menos durante as festas que se aproximam.
Um bom Natal.

PS: Depois de escrever este comentário estive para o retirar, o melhor seria nem dizer nada, pois estou a ser politicamente incorrecto, e a Catarina irá desancar-me na certa, e eu nem sou de guerras, mas acabei por decidir que devia comentar. Por vezes as pessoas precisam de ouvir mais do que as palmadinhas nas costas.
PiresF

Ora bem.
Caríssimo PiresF. Eu, quando me refiro à clientela, também o faço em tom de brincadeira. Aliás, quase tudo o que aqui escrevo é sempre na palhaçada, como já deve ter reparado.
Vamos lá por pontos:
as bloggers (e os bloggers, não? Enfim, deixemos passar essa diferenciação entre ‘as’ e ‘os’ senão nunca mais saimos daqui) estão de pança cheia e mais não sei que mais – se calhar não produzem mais porque não podem, não lhes apetece, têm mais que fazer, estão fartas do blog, mas não o fecham porque de vez em quando lhes apetece escrever qualquer coisa, que até pode ser uma caralhada (passe o vernáculo) porque as gajas também podem escrever expressões menos próprias de senhoras que provavelmente não usarão perto das avós, mas que, num desabafo ou para mero efeito, podem perfeitamente escrever num blog.
Eu posso realmente espetar o que me apetecer no meu blog. É meu. E quando digo que é meu, é essencialmente por ser meu (lógica da batata) e porque me apetece por vezes dobrar a página daquele dia em particular com uma frase ou duas que não fazem sentido senão para mim. Imagine que eu escrevo um post totalmente desinteressante e que reza assim:

– Hoje choveu e botas de borracha são giras.

e os meus estimados leitores dizem, esta anda uma chata (de galochas, já agora).

Mas aquilo que eu posso estar a escrever nesta agenda na net é um apontamento que me avivará a memória quando o reler e saberei que naquele dia

saí de casa com o meu filho pela mão, calçado de botas de borracha azuis, novas, que está sempre a precisar de botas, cresce tanto, mas ainda é suficientemente criança para ir saltar em todas as poças que encontrar e, de repente, a mim também me apetece salpicar as calças e os casacos, esqueço-me da chuva e, em vez de ir a correr a puxar pela mão dele, desato aos pulos e ele desata a rir.

Eu não preciso de me lembrar disto, só preciso de um post-it aqui no meu tasco para saber que naquele dia foi o que aconteceu, naquele dia e não noutro, no dia a seguir a ter escrito outro post que tem uma ou meia dúzia de palavras, como por exemplo

As filas de supermercado são uma guerra.

e já me lembro que, no dia anterior, quando comprei as botas e mais coisas, mandei um berro de CALMA a um tipo que foi muitíssimo malcriado só porque eu demorei trinta segundos a limpar cotão da cara do meu filho que se tinha metido para debaixo do tapete das compras.

É nesse sentido, mais do que em qualquer outro, que este blog é MEU. É que eu tenho os meus fiéis leitores, mas daqui a uns tempos, o único fiel leitor que terei dos arquivos (uns tempos sendo uns anos ou assim) serei eu a pensar, olha que cómico, no tempo em que eu tinha um blog escrevi isto ou aquilo e foi sobre isso ou aqueloutra coisa. Que não vou escrever preto no branco, pois ninguém tem nada a ver com a minha vida privada, aquela que eu não quero divulgar em público: são coisas minhas.

Quanto aos comentários e ao pedido-choradinho de comentários ali de uns posts abaixo: eu às vezes digo aos meus amigos, ando a escrever para as paredes, talvez dez por cento dos leitores entendam o que eu escrevo, os outros não. Só lêem o sentido literal. Então o meu caro PiresF não percebeu que aquele choradinho era a GOZAR??? Dou prémios a mim mesma e ainda vou buscar os que os leitores, que entram no espírito da coisa, me atribuem e faço um espectáculo de ‘oh que boa que eu sou, deixem mais, deixem mais!’ e não se percebe que estou a gozar com os prémios e comigo mesma?
Agora se acha que é merda, está no seu pleno direito. Aliás o seu comentário em tom de brincadeira comparava a leitura do meu tasco ao ter deixado de ver o Herman. Não foi lá muito simpático, mas enfim, ok, admito, é uma forma a brincar de dizer que a coisa deixou de ter qualidade. Lamento imenso, mas bons textos não se escrevem a correr entre as gotas da chuva, demoram tempo que não tenho; mas não acho que tenha que fechar isto só porque os meus posts são uma merda. Quem gosta gosta, quem gostava mais, pois paciência, que já tive alturas da minha vida que tinha muito mais tempo para isto do que agora e agora é o que há, não há mais, não tenho qualquer disponibilidade para mais. Tenho pena, claro, que eu gosto muito de escrever, mas é a última das minhas prioridades; nem sequer posso dizer que seja a primeira das prioridades no meu tempo livre, porque não é, há muitas outras opções que passam à frente.

Quanto ao tal mau feitio, entenda de uma vez por todas: faz parte da linha editorial. Este blog é escrito por uma personagem quase real, ou por uma pessoa que deixa aqui o seu lado irritado. Acho piada e se há quem acredite que sou mesmo assim, pois melhor, quer dizer que é credível.

Estou-me nas tintas para ‘as palmadinhas nas costas’ ou para ‘precisar de ouvir mais’. É que para mim, os meus blogs são uma coisa para me divertir, para servirem de registo de algumas coisas e para, eventualmente para apenas e por força das circunstâncias de ser público, entreter quem me lê. E nem sequer costumo explicar o que escrevo, mas dado o espírito de paz e boa vontade deste tempo, cá está a coisada toda, que até pode servir para mais gente que pense o mesmo que o PiresF.

Um bom Natal também para si e um abraço.


"Going Postal" (2)

“There were two men dressed in black standing behind his chair. (…)
They stood aside as Moist walked towards the door, which, as promised, was indeed there. He opened it very carefully. There was nothing beyond, and that included a floor. In the manner of one who is going to try all possibilities, he took the remnant of the spoon out of his pocket and let it drop. It was quite a long time before he heard the jingle.
Then he went back and sat in the chair.
‘The prospect of freedom?’ he said.
‘Exactly’, said Lord Vetinari. ‘There is always a choice.’
‘You mean…I could choose certain death?’
‘A choice, nevertheless,’ said Vetinari. ‘Or, perhaps, an alternative. You see, I believe in freedom, Mr. Lipwig. Not many people do, although they will protest otherwise. And no practical definition of freedom would be complete without the freedom to take the consequences. Indeed, it is the freedom upon which all the others are based. ”

Going Postal, Terry Pratchett


"Going Postal" (1)

“Being an absolute ruler today was not as simple as people thought. At least, it was not simple if your ambitions included being an absolute ruler tomorrow. There were subtleties. Oh, you could order man to smash down doors and drag people off to dugeons without trial, but too much of that sort of thing lacked style and anyway was bad for business, habit-forming and very, very dangerous for your health. A thinking tyrant, it seemed to Vetinari, had a much harder job than a ruler raised to power by some idiot vote-yourself-rich system like democracy. At least, they could tell the people he was their fault. ”

Going Postal, Terry Pratchett