No meio de qualquer coisa, de qualquer conversa, uma palavra, uma frase (mas essas são as alegrias…) que me comove. Que me dói, quase. Por ser inesperada (racionalmente não é, mas bate à mesma como se fosse), por ser tão simples (por ser a tradução exacta daquilo que eu estou a complicar), e por ser tão terna (inesperadamente terna).
Isto não se aguenta, pá!
Imagine-se que tá um gajo morto de fome a roer uma bolacha antes de almoço ou do lanche ou do jantar, já irritado que nunca mais enfarda um belo de um bife com muito pão com molho e batatas fritas e ovo a cavalo, enervadíssimo com a porra da bolacha que cada vez sabe a menos, abre a página de entrada do weblog a ver se distrai aquela fome toda, se lê qualquer coisa que lhe tire o bife da ideia, que ajude a passar o tempo até chegar à altura de mergulhar o pão na gordura e o que é que vê?
– rolo de bacalhau
– arroz de peixe com ervilhas
– espetadinha de lulas
– camarão no forno
– cabrito frito
– rolos de vitela com azeitonas
– sopa de chouriço
– pudim gelado de natas
e por aí fora. O dia todo e sempre sempre quando aparece a mais negra das fomes, que fica mil vezes pior depois. Este Pedro Nuno é um algoz, o verdadeiro sádico, capaz de nos pôr a todos a salivar cada vez que se olha para a lista de actualizados. É um martírio, isto! Páre, homem, que isso acaba comigo!
E agora vou imprimir o blog da Culinária daqui e d’ali todinho…:)
Antes que me esqueça
O que é mesmo estranho, penso eu, é que as sombras são as sombras do meio dia, pedaços de jardim muito iluminados pelo sol e os outros muito sombrios por oposição, porque o sol cega. E se é meio dia não vai já escurecer, mas é isso que acontece.
O jardim é cá em baixo, muito verde e cerrado, cheio de árvores e arbustos e trepadeiras que sobem pelo muro até lá acima, à estrada que passa por cima do riacho. Cá em baixo, no jardim, há um caminho e uma ponte antiga, de pedra. Depois o caminho sobe, uma ladeira muito larga, o fim do jardim, e encontra-se com a estrada lá mais à frente. A estrada faz uma curva e tem uma parede muito alta à frente. E é nessa parede que estão escritas as frases.
Em cima da ponte está (esteve?) o camião avariado. Está (esteve?) vazio, não tem ninguém. Aliás, não está ali mais ninguém senão eu, naquele jardim e estrada desertos, à luz de um meio dia a fazer-se quase noite. E as frases da parede (quais são? Quais são que me perseguem e não me lembro, não me lembro! Vejo-as e não as consigo ler agora) são relacionadas com o camião, ou com a avaria. Ou com o motorista (passageiro?) do camião, ou alguém que tem alguma coisa a ver com tudo aquilo, mas que não está (não devia estar) ali. Um atropelado? O camião em silêncio, vazio, o jardim parado, as sombras aumentam, as frases que não consigo ler agora, que sei o que eram mas não me lembro, não as deveria ter lido, sei agora, não deveria estar ali, preciso de ir embora já, mas há qualquer coisa que me impede, que não me deixa andar. Um lamento ao longe, palavras numa voz muito fina, uma voz chorosa, que tenta enganar-me com esse lamento, uma pedido de socorro disfarçado, uma ameaça na sombra, é (eu sei) um homem vestido de farrapos (a roupa que se desfez no embate?), uma criatura que me irá perseguir porque eu sei, eu li, embora não me lembre. É só uma questão de tempo até me apanhar (eu sei), não tenho saída. Escuso de fugir, não há saída e a voz aproxima-se nas sombras. Ficou noite de repente.
Acordo às quatro da manhã. Assim. E para não me esquecer, desenho esse jardim.
Ser mãe – o lado de cá
A Rititi meteu um post sobre a maternidade das chatas (os termos são meus e eu adorei o post dela, atenção!). E como é um tema que me agrada e antes que lhe encha o blog de comentários, o melhor é debitar a coisa aqui.
Eu percebo perfeitamente. Antes de ser mãe, achava as gajas todas que eram mães umas chatas de galochas. Não havia a mais pequena paciência para aquilo, para as conversas, as discussões, a concorrência feroz (o meu já anda, ah mas o meu tem quatro dentes, mas o meu já fala e o lado negativo, pior ainda, o quê, o teu ainda não fala? ah mas o meu com essa idade já dizia imensa coisa, o teu não tem dentes? já o levaste ao pediatra? olha que isso não é normal, tu dás sopas com sal??? mas isso faz imenso mal! iadaiaidaiadaiada) entre as mães, a mostra das roupas novas (olha o que eu comprei para a não sei quantas, o xiripiti, não achas o máximo? são uns babetes à prova de bala, reforçados com amianto, como o amianto é proibido? tás parva, isto é da marca xpto, eles só fazem coisas bestiais para as crianças e iadaiadaiadaiada), enfim, todas as secas que apanhei e foram muitas mesmo, já que fui mãe depois de ter idade para ter juízo, ainda tendo que apanhar com todas as piadas de tias, avós, primas e quejiandos, sobre a falta de filhos, o tempo e os relógios biológicos, a ameaça imensa do ainda ficas para tia até chegar à altura em que fiquei para tia e o mundo exterior, abanando a cabeça (esta não tem nem vai ter nunca juízo nenhum), desistiu de me tentar convencer que ter filhos era uma obrigação, o destino das mulheres e nada mais havia senão parir e criar criancinhas para a felicidade plena. Fiquei para tia, continuei sem juízo e vivi todos os copos, noites em branco, esplanadas de madrugada, dias a trabalhar com directas em cima, amigos e fins de semana marados e viagens e idas e vindas e namorados e maluqueiras e bebedeiras e vómitos e entradas em casa de gatas e guiar a ver quatro estradas, enfim, acho que fiz tudo o que me deu na cabeça, me apeteceu e que achei bem ou achei mal, mas fiz à mesma.
E depois tive um filho.
Que a maternidade muda as pessoas é dizer pouco. Não há nada que mude tanto uma pessoa. Muda mesmo, é assim, nada a fazer. Não me falem em hormonas ou instintos ou o caneco: se calhar é só mesmo uma glândulazinha que nos faz ficar assim, talvez. É uma explicação simplista, fácil de aceitar, uma boa desculpa. É sempre fácil arranjar boas desculpas, mas eu recuso-me a aceitá-las, a desculpar-me com o instinto, com a falta de tempo que a vida de mãe traz, com tudo isso que sim, existe, mas não é só e não é isso. Há coisas para as quais não vale a pena inventar razões e o amor é uma delas. Acontece. Toda a gente sabe o que é uma paixão, não é preciso explicar o que é, toda a gente aceita que as pessoas se apaixonem, que o objecto da paixão e do amor passe a ser prioritário, que se tente estar com aquela pessoa o tempo possível e o impossível. Ter um filho é isso e muito mais. É não só apaixonarmo-nos por um ser humano, total, irreversível e perdidamente, como sermos correspondidos com um amor absolutamente absurdo, carente, dependente, fixo em nós, com antenas, com ciúmes, com garras que não largam. Há quem diga que não nos apaixonamos por alguém em concreto, por qualidades escolhidas ou defeitos que não queremos, mas pelo amor em si (provavelmente por isso é que tantas vezes dá para o torto). No caso de um filho, talvez seja um pouco assim, não sei. O que sei é que é um amor completamente diferente de todos os que senti durante a minha vida. É um amor que não se quer para nós, mas para eles, para os objectos do nosso amor: é querer tudo para aquela pessoa pequena. É esquecermo-nos de nós, porque aquele amor é maior que nós. E é isso que nos muda a maneira de ser, o egoísmo intrínseco de todos os seres humanos. É isso que muda, que nos muda, deixamos de ser tão egoístas, tão centrados em nós, no nosso bem estar, na nossa vidinha. Não ficamos melhores pessoas que as outras: ficamos melhores do que éramos. Eu pelo menos fiquei. E claro, com isso vem o resto: tornamo-nos umas chatas que não sabem falar de outra coisa.
Eu hoje acordei assim (*)
The very thought of you and I forget to do
The little ordinary things that everyone ought to do
I’m living in a kind of daydream
I’m happy as a king
And foolish though it may seem
To me that’s everything
pic Darren Holmes, no xc
(* copyright Charlotte)
O mundo não é desenhado para mulheres sem homens ao lado
Depois de várias horas a ver tudo, a decidir que depois então voltamos cá para encomendar isto e aquilo, depois de encher sacos e carrinhos com dezenas de coisas que faziam imensa falta, chegamos ao corredor onde está a embalagem daquilo que me levou lá. Olhamos as duas para a caixa. Olhamos para a etiqueta a ver se é a certa. Olhamos outra vez para a caixa. Eu ainda tento dar-lhe um pontapé (lírica!). E depois, uma enorme vontade de rir. Jamais em tempo algum seremos capazes de mover a caixa um milímetro que seja.
Vamos embora e na caixa, pergunto: queria comprar uma coisa mas é um bocado pesada, aqui ajudam a meter nos carrinhos, mas depois despejar no carro não, não é? O rapaz ainda adianta que no parque às vezes há arrumadores…a minha Mãe diz (e eu conheço tão bem aquele tom! É o destinado a tudo quanto funciona mal, desde a menina que lamenta mas ali não se efectuam trocas mesmo que as coisas estejam estragadas, até vereadores de Câmaras que não fazem o que devem; e que precede em segundos o pedido ‘o livro de reclamações, se faz favor’) qualquer coisa como portanto isto é para as pessoas fazerem elas mesmas, mas só se forem homens com força, não é? As senhoras estão excluídas…mas não vale a pena, é mesmo assim. O mundo não é desenhado para mulheres sem homens ao lado.
E eu hei-de lá voltar e desfaço a embalagem para dentro do carrinho.
Larai larai (consumismo ó ismo, ó ismo)
Uma pequena constatação (des)umbiguista
Eu chego aqui, penso ora então e nem dá mais tempo. Despejo a primeira merda que me lembrar, siga siga siga, às vezes respondo aos comentários, outras vezes não, trato o template ao estalo e ao pontapé, há dias em que trato os leitores tão ternamente como trato o template…enfim, a gente todos sabemos o que a casa gasta e tá sempre aqui tudo pendurado. Eu não me estou a queixar, atenção! Estou só a constatar a primeira parte do facto, sendo que a segunda esta: ter um blog que dá trabalho, cheio de bonecos e merdices no template, textos compridos (tá bem pouco pensados mas sempre é mais do que aqui) ilustrados e tudo, andar a meter links e a actualizá-los (desordenados mas já é um grande esforço!) e mais um monte de etc’s., tudo isso não é sinónimo de visitas. :DDD
(PUM! Isto é o ruído que faz o balão do ego a rebentar!)
A Mãe liga-me. Diz-me, li tudo quase de seguida. Gostei muito, filha.
(acho que estava à espera deste telefonema há dois anos)
Chuva e distracção
Vinha a rir-me tanto com a chuva que me esqueci de virar na rua certa e agora tenho o carro todo mal estacionado (mas assim fica lavado).