100nada

O babysitting

Depois de ter chegado aqui hoje e ter ficado mesmo feliz com o presente do Rui Semblano, acabei por passar umas horas muitíssimo aborrecida com uma série de coisas que abaixo se poderão ler. Já que é assim, aproveito para destilar mais um pedaço da minha acidez (e aviso que a hora da falinha mansa já terminou; uma pessoa só tem capacidade para engolir a “merda dos posts” que escreve até uma certa altura; depois acabou-se).

Hoje, ainda antes de todo este circo, caiu-me uma moedinha que me tinha passado completamente ao lado. Devo ser distraída ou então não percebi mesmo que havia esse item à mistura.

Passo a explicar:

Este ano é o primeiro ano em que entrou em vigor em todas as escolas básicas, aquilo que se chama o prolongamento. O prolongamento são mais horas de aulas, alargamento do horário até às cinco e meia. É opcional, os pais podem escolher não ter os filhos no prolongamento, mas aquilo que se ensina no prolongamento são disciplinas, à escolha (dentro dos possíveis, creio eu) pelas escolas ou agrupamentos. Note-se bem esta palavra: disciplinas. Música, expressão plástica, educação física, ballet, teatro, inglês a partir do 3º ano, enfim, uma série de disciplinas; inclui ainda umas horas de apoio ao estudo.

Eu não posso garantir que tudo isto seja a nível nacional (estou certa que serei corrigida se me enganar), mas quem dá as aulas das disciplinas do prolongamento não são os professores do ensino básico e sim os professores do ensino secundário (se tiver agora outro nome, digam).

Ora muito bem, está explicada (em termos leigos) a situação.

E começo a ler, por aqui e por ali, coisas como “não somos babysitters”, “não somos animadores culturais”, “arranjem quem tome conta dos miúdos, não é esse o papel dos professores”, “os pais despejam as crianças na escola” e coisas do género. E eu sempre a leste.

E depois, de repente, percebo o que é que se passa. ALGUNS professores acham que dar essas disciplinas é babysitar. Ensinar disciplinas concretas a crianças do ensino básico é tomar conta delas porque os pais não podem. E fico absolutamente estupidificada com isso porque nem consigo acreditar que seja assim. Digam-me que estou enganada, por favor, que eu agradeço mesmo muito.

Duas notas a este post:

O meu filho tem, dentro da pasta das coisas que faz no prolongamento, uma folha que tem uma pauta, com uma clave de sol (ele disse-me o nome) e as notas todas escritas. Pega na folha e aponta dó ré mi fá sol lá si dó. Na mesma folha estão desenhados instrumentos musicais e colcheias e semi colcheias. Aprendeu que a música se escreve e aquela é a linguagem que se utiliza.
Tem também desenhos de histórias que se contam noutra disciplina do prolongamento. Ouvem a história e desenham o que ouviram.
E conta-me que, noutras aulas, jogam à mímica com nomes de animais que o professor lhes segreda, para o outro grupo adivinhar. Só por gestos, diz ele.

Tem seis anos. Aprende a brincar. Um grande bem haja aos professores que lhe ensinam estas coisas; não me parece que estejam aborrecidos por babysitarem.

A segunda nota que aqui deixo é um comentário da Susana (foi, aliás, este comentário da minha irmã que me abriu os olhos para a realidade), que está neste post do Mundo Perfeito (Isabela, minha querida, adoro-te e a tudo o que escreves, mas não posso concordar com essa ideia da “espécie de continuação do trabalho das amas”).

Aqui transcrevo parte do referido comentário:

“por outro lado parece-me que esse tempo «extra» que querem atribuir aos professores também poderia ser ocupado com exercícios lúdicos (ou nem tão lúdicos, como, por exemplo, a realização de um jornal) e apoio ao estudo dentro das próprias matérias que ensinam – e aí, continuariam a ser professores ou continuariam a extrapolar das vossas funções…? (olha que é mesmo uma pergunta) por exemplo, uma professora de português que fazia a extensão curricular na escola do meu filho mais novo, adorou a experiência, porque passava esses 45 minutos a contar-lhes histórias e a falar sobre elas. não estava a sair da sua matéria, estava a ensinar. é que, com crianças, tomar conta delas também pode ser ensiná-las, e não entretê-las. claro que aqui também dependemos da boa vontade, do entusiasmo e, sobretudo da generosidade e criatividade dos professores em causa… do mesmo modo veria um professor de fisico-química a poder mostrar-lhes experiências simples e a ensinar-lhes alavancas com mecano e lego, um de inglês a ensinar-lhes lengalengas, rimas e carols, so on… eu mesma sempre me ofereci para colaborar em qualquer projecto das escolas no âmbito da minha actividade profissional, por conseguinte parece-me estranho que os professores considerem esta questão como baby-sitting, percebes? agora se for pra isso, estou de acordo contigo.”

0 thoughts on “O babysitting

  1. Sofia

    Os prolongamentos não funcionam em todas as escolas Catarina… Ao contrário do que a ministra diz, há escolas sem recursos, sem salas disponíveis para os prolongamentos como aquela onde estou onde tal é a quantidade de alunos e também devido ao horario (8:00-13:00/13:15-18:15) que as salas estão sempre ocupadas, não havendo locais para funcionarem esses prolongamentos. Ali, onde pais têm poucos recursos, não há outra remédio senão optar pelo ATL (pago)ou então arranjar alguém que fique com as crianças.
    Mas a ministra não se preocupa com as excepções…

  2. catarina

    Sofia, muito obrigada. Eis finalmente alguma coisa construtiva no meio disto, que explica uma parte. Nesse caso, da falta de condições logísticas para um prolongamento como deve ser, estou em total acordo contigo e desacordo com a ministra e entendo que os professores não aceitem esse tipo de actividade.

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