100nada

O OE e o FMI trocado em moedas de cinco cêntimos

Antes do mais, recomenda-se a leitura deste meu post, para se perceber o que é o défice.
Depois faz-se aqui um disclaimer, que esta é, como sempre, a minha opinião absolutamente pessoal.

Segue o OE num parágrafo e o resto em mais uns quantos.

o OE (Orçamento de Estado) é exactamente a mesma coisa que todas as minhas caras leitoras, no seu papel de donas-de-casa, fazem todos os meses, com a diferença que o Estado é a Casa delas e portanto fazem o OC. De resto é igual: entra dinheiro de várias fontes – receita – e sai para vários lados – despesa. Receita, no OC é salário+/ou outras fontes de rendimento, no OE é impostos + NADA; despesa no OC é pagar contas e no OE é pagar contas. Qualquer dona-de-casa eficiente faria uma melhor figura a gerir este país que este conjunto de nabos, mas isso já são considerações de ordem subjectiva, que vou tentar conter, mas ainda farei mais uma: sabem as caras leitoras quando se vêem a braços com aquelas situações em que ainda falta pagar a conta da água e da mercearia e aparece o parceiro com quem se divide receitas e despesas, todo contente com um saco de dvd’s, livros para acrescentar à pilha e mais umas quantas merdas de bricolage, decoração e animação automóvel? Trocado em OE’s, esses saquinhos de bens não essenciais, são submarinos e TGV’s: brinquedos de gajos. Lá está. QED e siga para o FMI.

Escusado será alongar-me na parte em que se indica que
– o OE proposto é uma merda
– Os gajos não se entendem
– Misturar política com economia só dá porcaria
que isso toda a gente já sabe.

Vamos lá então para o mito FMI.

Só vamos saber se o OE é aprovado daqui a uns dias. Entretanto toda a gente (incluindo os portugueses) já percebeu que isto não está grande espingarda e digamos que a confiança, quer interna, quer externa, está pelas ruas da amargura, sendo que está última é inversamente proporcional ao estado da dívida pública. Uma desce, a outra sobe: se parece que não conseguimos pagar a conta, os juros sobem, porque o risco aumenta, obviamente. As caras leitoras emprestariam o melhor par de sapatos a uma amiga que o devolveria em estado impecável e a amiga oferecia uns chocolates como agradecimento, mas se soubermos que a amiga dá cabo deles, se calhar dizemos-lhe, olha filha empresto-tos mas empresta-me aí esse casaquinho entretanto, que se os sapatos vierem todos lixados, vês o casaco por este canudo – esta é a posição dos investidores estrangeiros, a dívida externa é exactamente a mesma coisa: se a malta não paga, pois obviamente que dá em troca o casaco. Neste momento estamos na fase de até já dar as cuecas, ou inclusive baixá-las. Financeiramente falando, claro.

Face a isto temos três hipóteses: ou há OE ou não há. A terceira (que é separadas das duas primeiras, porque havendo ou não havendo OE aprovado, a verdade é que o FMI vai começar a falar mais em português e eu não acredito em coincidências e sim em circunstâncias e planeamento) é o tal do FMI que está para os portugueses como a Nossa Senhora de Fátima. Entra por aí fora a pedido e preces, faz uns milagres e isto fica tudo lindo. Era bom, mas não é nada assim, minhas amigas.

Primeiro, um país que não consegue ter um OE aprovado, é uma vergonha. Todos sabemos, mas isso tem um preço. Ok, pois o brio deste país não vale porra nenhuma, adiante, esqueçam, somos incompetentes e atestamos com um chumbo no OE que de qualquer forma é uma merda. Venha o FMI, vamos supor.

O FMI chega e endireita? Diz-se em jeito de mesa de café, que venha, endireita este descalabro todo de uma vez, já que ninguém consegue. Eu também, confesso, tenho esse meu lado de pastorinho à beira da oliveira. Mas agora, mais que nunca, temos que pensar friamente. O FMI chega, analisa e corta. Sim, a dívida externa baixa. Sim, endireita qualquer coisa. E sim, corta a direito. Corta a direito, perceberam? Não há mais conversa, discussões sobre o preço da margarina ou sobre gente a comer de caixotes do lixo. Corta mesmo onde for preciso. E depois, dá o dinheiro a quem? Ah a quem governa. Pois é. Naquela, corta-se aqui e tomem lá mais, agora ganhem juízo. Alguém acha que isto resulta?! Eu tenho algumas dúvidas. Tenho sempre dúvidas quando é preciso tratar os países como crianças mimadas que partem os brinquedos e pedem outros, porque não tenho a certeza que cresçam se lhes derem um raspanete e brinquedos novos. Queria muito – de mãos postas – que o FMI resolvesse todos os nossos problemas. Mas infelizmente, parece-me que também não é por aí.

Soluções fáceis? Não há. Há e vai haver um país pobre a levar cada vez mais pancada até mudar de hábitos. Até nos convencermos todos – todos – que assim não vamos lá. Até nos convencermos que temos que fazer mais, muito mais, gastar menos, muito menos, a troco de ainda menos. E essa porra custa. A única razão que me leva a isso, que me motiva é só uma: é o MEU país. É o país dos nossos filhos. Ainda é, pelo menos. É um bocado de brio e teimosia e ainda acreditar que há gente decente.

E este post virou lamechas e irracional, portanto fica já por aqui com uma nota final para reflexão: não há milagres grátis.

19 thoughts on “O OE e o FMI trocado em moedas de cinco cêntimos

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  7. Tim

    Engraçado, mas algo simplista…

    há investimentos que não são apenas um dvd, algo para entreter, mas um fato novo, ou outra ferramenta para quem trabalha em casa. é preciso para trabalhar mais e melhor (para conseguir aumentar o salário no fim do mês).

    Mas claro que mesmo aí há alturas em que é preciso poupar, e o fato que se tem serve perfeitamente por agora…

  8. Catarina Campos

    Obrigada pelas refs.

    Tim, como pode ler pelo título, a ideia é exactamente ser simplista (trocado por moedas de cinco cêntimos, porque de textos herméticos estamos todos fartos (também os poderia escrever, mas aí desaparecia a finalidade). E quanto àquilo que chama investimento, a diferença é que um investimento é realmente uma ferramenta que produz outro bem, serviço ou rendimento. Um objecto de entretenimento não é um investimento, é um gasto. E sim, esta é uma altura de poupar. :)

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  10. SOD, o Pérfido

    Temos o governo e o OE que merecemos. Somos todos nós, que compramos desalmadamente telemóveis, automóveis e imóveis, com ou sem rendimentos à altura, que contribuímos para o défice. Uma boa parte de nós trabalha ou conhece quem trabalhe na função pública. E quantos dessa parte mostram indignação sobre os desperdícios no Estado? Só quando não chegam à teta.
    Quantos de nós pagam as despesas a tempo e horas? Quantos poupam para terem dinheiro para o seu “TGV” e não recorrem ao crédito? Quantos se preocupam com o orçamento do seu próprio condomínio?
    Com tanta preocupação com o OE e tantas donas de casa com orçamentos equilibrados, não sei como chegámos a este ponto…
    A malta fala, fala, fala…

  11. Catarina Campos

    Sim e não, SOD. Provavelmente as donas de casa equilibram bem melhor as suas contas que o governo as contas públicas. O mal não está no consumo, está no desperdício.

  12. Pingback: “Não há milagres grátis!” | Economia e Finanças

  13. Zedumundo

    Tenho aprendido pouco na tv mas ontem, este sr. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_da_Silva_Lopes) falava na rtp1 e dizia duas coisas (que os seus 78anos já lhe permitem):

    1-No seu tempo como ‘orçamentador’ esperou que o FMI entrasse e ordenasse as medidas que ele não teria ‘coragem politica’ de impor, sob pena de ser social e imediatamente desmembrado (decepado?esventrado? :) ) Será que estes artistas de circo PS/PSD estão a tentar este número arriscado outra vez?!?!

    2-E sugeriu: como toda a gente sabe (ou devia), o problema não está no ‘orçamentar’ mas na execução desse orçamento (i.e. no que é efectivamente gasto no ano seguinte, algo que também é monitorizado pelas agencias europeias e de rating e o camandro que monitoriza), logo (e chegamos finalmente à sugestão) ->> Todos (mas todos!) os responsaveis Politicos por orçamentos(é um contrasenso juntar as duas primeiras palavras, eu sei, mas…) – presidentes de Camara,presidentes de governo Regional,admin institutos publicos e por aí adiante – deveriam, POR LEI, ser impedidos de se candidatar a cargos públicos por 10 anos, caso o orçamento do organismo de que são responsáveis não fosse cumprido. É ou não uma ideia ganhadora??

  14. Ernesto

    Aqui a dado momento fala-se em merda…como o povo diz que merda é dinheiro, pode ser que daqui saia o contributo definitivo e tão desejado para resolver os problemas do país e menos conversa de chacha…

  15. Pingback: Nuno Manuel Costa

  16. jpt

    confesso que não li tudo pois estou exausto pelo esforço intelectual havido na minha contribuição ao texto sobre estratégias de poupança, acima colocado (chuveiros, sanitas e coisas assim, tendo notado que a dinâmica bidé foi algo esquecida). Mas sobre a matéria aqui em causa, e dado que há anos que ouço dizer que fazer um OE é como fazer o orçamento de casa ,qualquer dona de casa o poderá fazer (daí a proposta do dr. Mário Soares de dar um subsídio mensal às ditas donas de casa, algo que acabou por se esquecer), e como não percebo nada nem de finanças, nem de economia, nem de dinheiro, assusta-me sempre isto: li, um dia, no jornal que a despesa pública tem um papel indutor [ou potenciador] da economia (ou pode ter, quando benéfica). Ora quando a D. Celeste faz as suas contas para gastar o parco pecúlio que o sô Santos não estoura nas jolas, no totobola e nos pasteis de nata da Alzira, ela está também a pensar em no potenciar da economia doméstica, na formação de capital, no futuro etc e tal. Ou está mesmo preocupada com a conta da luz? Ou, por outras palavras, tenho que ouvir até morrer que fazer um OE é o mesmo que fazer um orçamento familiar, só que em maior?

    CC, vou ali às jolas, preencher o totobola.

  17. SOD, o Pérfido

    Daí o desalmadamente. O dinheiro sai-nos do bolso directamente para o estrangeiro, com tanto consumo. E se o que temos funciona, porquê comprar novo? Este consumo não é um desperdício?

  18. Pingback: 3-in

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