Num semáforo qualquer (ou então não)
A rapariga sai da arcada sem hesitar e atravessa a rua vazia. Chove torrencialmente mas o facto apenas é registado como estado do tempo e não serve para paragens ou abrigos. Na mão uma chave e umas moedas que são metidas num parquimetro, sem pressas. Um homem passa, debaixo de um guarda chuva, quase pára, continua a andar a olhar para trás. A rapariga tira um papel da máquina e começa a descer uma rua, velocidade de cruzeiro, como se o dia fosse completamente azul. A acrescer ao facto chuva torrencial regista outro, mais curioso: as gotas da chuva não lhe caem em cima. Não há uma única gota no cabelo, na cara, no casaco. E, no entanto, a chuva continua a toda a volta, baldes de água por todo o lado; menos sobre ela. Estou imune à chuva, ri-se ela. E quando olha para cima, sorriso aberto, apanha uma molha de todo o tamanho. Bem feita, ri-se ainda mais. Para não me armar em parva, a achar que nem a chuva me toca, em dias assim. Corre então, abre o carro, atira-se lá para dentro, encharcada. Encosta-se, passa a mão pelo cabelo e decide, claro, não será sobre o que me trouxe assim, mas será sobre a chuva que não me tocou.
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