No semáforo vermelho
(durante Agosto apenas)
A pedinte do costume, saia até aos pés, trança caída e criança pendurada na mama, desaparece e, durante uns dias, ainda no final de Julho, o lugar – aquele excelente lugar, em cruzamento de avenidas e um bom minuto de tempo entre o vermelho e o verde – fica vago. Nos primeiros dias de Agosto aparece um novo pedinte. Homem quase rapaz, ainda muito novo, de bom aspecto. Não bate nos vidros, não insiste, um pedinte que não incomoda. Traz uma criança pela mão. Essa é a primeira diferença: nunca, mas nunca larga a mão do rapazinho que o acompanha. Leva-o para o meio da fila de carros, mas coloca o corpo de forma a proteger o garoto e nunca larga a mão. A outra diferença é no rapazinho. Tem um boné, veste t-shirts e calções, meias e ténis. E, todos os dias, todos, traz a fralda da t-shirt dentro dos calções. Sempre composto, mais composto que quase todas as crianças que conheço.
E eu convenço-me, quero convencer-me com muita força que está ali um pai com um filho. Faz de conta que a escola fechou em Agosto e o pai é pobre e não tem emprego e não há onde deixar a criança e leva-o com ele. Convenço-me que é um pai preocupado com o facto de o filho estar no meio da rua, por entre os carros. Que é um pai que quer que o filho, ao menos, ao menos, esteja composto e com bom aspecto. Porque – convenço-me eu – não tem outra alternativa senão pedir.
Convenço-me, é certo. Convenço-me e comovo-me. Mas não lhe dou, não dei, naqueles dias todos; nunca dei.
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- Oh que simpáticos!