100nada

Cizões azuis (um repost)

Não costumo (nem muito nem pouco) fazer reposts de uns blogs para os outros. Parece-me sempre que, se um texto meu está num sítio, é para lá estar e não para eu depois o copiar para aqui. Mas depois de ter escrito ali em baixo sobre cizões azuis, lembrei-me que tinha escrito uma coisa parecida (e que agora, depois de reler) até me parece quase uma explicação. Engraçado isto…e como a Dulce pediu um cizão por email, mandei o link do texto. Depois resolvi-me a repostar a coisa.

Aqui vai então o texto de abertura da minha participação no Devagares. Quando muito gentilmente, fui ali acolhida e ali me abrigaram, em tempos mais tempestuosos deste tasco.

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As letrinhas mais pequenas

O Eixo N-S tem qualquer coisa que ainda não percebi muito bem o que é. Refiro-me a um ponto em concreto, mais precisamente àquela parte que passa sobre Sete Rios. Há ali uma mistura de energias, não sei se por ter de um lado o Jardim Zoológico e do outro uma Embaixada, se por em tempos ali terem estado sentados, já a noite ia alta, um grupo de pessoas muitíssimo suspeitas e totalmente inventadas neste preciso momento, o que para o caso não é relevante. O certo é que, na noite em questão, esse grupo de pessoas se entreteve a enviar para a estratosfera uma série de mensagens codificadas, tudo isto apenas com a força do poder da mente (o que é realmente extraordinário se pensarmos bem e se tivermos em conta que as atrás referidas mentes se encontravam em estado praticamente comatoso, devido à ingestão de carradas de coisas que não podemos aqui enumerar, já que as únicas testemunhas do acto tiveram posteriormente um ataque de amnésia conjunta).
Seja lá como fôr ou tenha sido, essas mensagens codificadas deram a volta ao universo todo, de uma ponta à outra e, como o tempo é relativo, demoraram uns anos ou coisa assim, a regressar. Não vieram todas juntas, foram aparecendo aos poucos, mas sempre no mesmo sítio: aquele viaduto (que o betão não as deixa passar para baixo até ao chão). E, volta e meia, caem em cima de um carro e aterram na cabeça do incauto que o guia: eu sei porque já recebi várias assim.

Que se trata de fenómeno de outro mundo ou pelo menos que por lá passou, não haja qualquer dúvida. A última, durante a semana passada, rezava assim:

– Correr a maratona.

Depois tinha umas letrinhas mais pequenas, mas essas só as consegui ler no semáforo seguinte. Até lá, tive ao meu dispôr uma boa meia hora para pensar que era uma ideia absolutamente alucinada. Talvez não seja para toda a gente, mas quem me conhece sabe que fico exausta só de pensar. Correr não é o meu forte ou fraco, correr é para gente doida que pensa que o desporto faz bem à saúde.

Quando cheguei ao semáforo lá consegui ler o resto. (Quando digo ler, evidentemente não é ler-ler: a mensagem aparece no cérebro, mas isso não a impede de ter fontes de tamanhos diferentes.)

Dizia assim:

Quando não se consegue sequer ter energia para fazer coisas pequenas, o melhor é apontar para as grandes. As que são inultrapassáveis, as maiores de todas, as enormes. Que estejam ainda longe no tempo para ser possível acalentar um sonho exequível. Mas que sejam mesmo quase impossíveis.
Essas é que são as boas.

(Eu não ia escrever nada disto, mas saíu-me. Quer dizer que me sinto muito bem aqui. Obrigada.)

em Devagares, 17 Janeiro 2006



ai

(suspiro) (levanta) (senta) (acende cigarro) (apaga cigarro) (suspiro) (ai) (caneco)

MARQUEM CANECO, MARQUEM CANECO, MARQUEM QUALQUER COISINHA CANECO ANDEM LÁ VÁ LÁ MARQUEM MARQUEM MARQUEM MARQUEM NERVOS NERVOS NERVOS NERVOS


auto-diálogo

– tu passas-te não é?
– não.
– é é!
– tá bem, é.
– não me faças a vontade!
– então, não.
– passas passas! e de maneira!
– nem por isso.
– ai não?
– não.
– que caralho é aquilo então?
– qual aquilo?
– não te faças desentendida!
– palavra que não sei.
– se não soubesses não estavas agora a escrever este auto-diálogo!
– tá bem, tá bem…
– vês?
– vejo o quê?
– como tu és.
– eu não. e tu, vês?
– não, não vejo nada…
– então vês!
– …passas-te é o que eu digo.
– não passo nada.
– passas sim.
– não me maces.
– és sempre assim.
– não oiço nada! não oiço nada!
– tira as mãos dos ouvidos!
– não oiço nada! não oiço nada!
– …
– não oiço nad
-…
-ainda tás aí?
– não.
– ah. era só isso? posso ir dormir?
– podes podes…(passas-te)
– disseste alguma coisa?
– nada nada.
– bem me queria parecer.

enganei-me caneco, xacáler isto outra vez…não, afinal tá tudo certo


Tramado isto!

Eu aqui roída dos dedos para escrever uma porra que seja e nada. Não se me ocorre nada. Não é nada normal em mim, mas sei a razão. Estou com uma coisa atravessada e não sei como a resolver. Não, não se trata de estado de alma ou coisa assim, nada de grave ou profundo, nada disso.

São cizões.

Antes que me digam que cizões não se escreve assim, adianto que se escreve, sim senhor, escreve-se tal e qual assim, que confirmei que a palavra não existe. Acabei de a escrever (e de a inventar) apesar de saber que há outra palavra com o mesmo som, mas não tem nada, mas mesmo nada, a ver. Esta, os cizões, eu nem sabia como se escrevia até ter inventado. Só sabia como soava. E sabia porque quando me começaram a cair cizões azuis do céu, soube logo que eram cizões azuis; ou melhor, o meu cérebro, do nada, atirou-me com eles para cima, assim, a meio de qualquer coisa outra: estão a cair cizões azuis agora, disse a voz interna e nem deu tempo de perguntar o que eram, prosseguiu logo, é melhor escreveres sobre isso, senão já sabes, antes que te saiam do sistema, não aparece mais nada. E, claro, entretanto, lá iam chovendo cada vez mais cizões azuis e eu a tentar fazer sentido de tudo isso e sem tempo para escrever sobre a porcaria dos cizões azuis que, ainda por cima, quando tocam no chão, se desfazem e fica tudo manchado com aquilo. Entre o escrever e tentar limpar a coisa, a coisa torna-se muito complicada: qual a prioridade? Acabei por deixar que o mundo se fosse manchando e vim a correr escrever antes que fiquemos todos mergulhados naquilo. Acho que parou, mas tenho medo que, se parar de escrever, comecem a cair outra vez. É demais isto. Agora, com tanta coisa para fazer, estou aqui agarrada a um texto, a ver se tento impedir uma calamidade.

Vou arriscar.

Alguém por favor me confirma se ainda estão a cair? Agradecia.


Depois arrependo-me sempre, mas na altura sabe tão bem!

Nota Prévia:

Eu deveria guardar este post para as três e meia, quatro da tarde; dessa forma conseguiria atazanar uma data de leitores e era muito mais giro. Mas eu nestas merdas desorganizo-me sempre. Sei os truques todos do blogar com sucesso mas não tenho a mais pequena paciência para os utilizar. Sou uma incompetente, é o que é!

Post:

Comi uma bola de berlim com creme. Daquelas a escorrer óleo e creme, andei até às pressas a limpar creme das bochechas tal era a fuçanguice. Resultado, tou enjoada que nem uma pescada (a propósito, finalmente a Salta Pocinhas e a Maria Árvore foram as pessoas que deram a explicação lógica para o rabo na boca) e agora almoçar nem pensar. Ai.


Olhó serviço público!

Eu também não sei fazer omoletes, Sophie!

Mas a Pal já nos ensinou, olé! Obrigada!

Ora bem, isto explicado assim por extenso não sei como vai sair…

Eu não deixo a frigideira anti-aderente, com um fio mínimo de azeite, aquecer muito. Mantenho o lume fraquito o tempo todo.

Só consigo fazer se for com dois ovos. Deixo que cozam devagarinho, cobrindo todo o fundo da sertã.

Tenho duas espátulas jeitosas com que vou tentando virar a beirinha do círculo. Assim que percebo que a parte de baixo está cozinhada vou arriscando o “enrolanço”. O ideal é dobrar em 3 (com algum recheio tipo fiambre ou cogumelos). E virar toda depois.

Durante muito tempo só conseguia fazer se ficasse muito muito muito bem passada. Um exagero.

Com a experiência já consigo fazê-la mais “molhada”…

(gostava de ser mosca para ver a vossa cara quando lerem isto aqui…:DDDD)


Desta é que endoidaram de vez!

(via Teacher)

“As despesas de educação poderão deixar de ser deduzidas no IRS, caso o Governo acolha a proposta dos especialistas a quem encomendou um diagnóstico e sugestões para simplificar as leis fiscais, avança hoje o Jornal de Negócios.

Além das despesas de educação, o grupo de trabalho sugere ainda que as Finanças ponham fim às deduções à colecta das despesas com lares, prémios de seguros e energias renováveis e a todos os benefícios fiscais que não sirvam para estimular poupanças para a reforma.”

in Jornal de Negócios

MAS QUE CARALHO VEM A SER ISTO?


Entorpecimento

A rapariga estava sentada numa cadeira a um canto da oficina, com uma toalha encostada ao peito. Ele tinha dito, agora vá ali sentar-se que eu, para ver isto com atenção, preciso de espaço à volta da mesa. Ela ainda tinha perguntado, um pouco a medo, mas e não faz mal estar aqui com tudo aberto desta maneira e ele, que não, que não, não havia razão para se preocupar, deixe lá a toalha encostada e vá fazendo pressão se o sangue fôr muito. Eu já lhe colo isso tudo outra vez e meti-lhe um coagulante, não vai ter aí nenhuma hemorragia grave. Deixe-me cá ver isto agora, se faz favor.

A rapariga não se sentia muito tranquilizada, mas lá foi ficando, com a toalha encostada e alguma curiosidade. Ia espreitando enquanto ele virava daqui e virava dali e mexia com pinças e enfiava tubos; mas quando lhe espetou uma agulha doeu-lhe e disse ai. E assustou-se com aquela ligação, ali sentada ao canto tão separada do resto.
Está a doer? perguntou ele, mas é mesmo só um bocadinho, tem que aguentar. Isto é perfeitamente normal, não se preocupe. Esteve aí dentro toda a vida, é natural que lhe doa, mesmo estando aqui agora na minha mão. Isto não pense lá que é só cortar que se separa tudo; aliás, isso é um dos problemas para lhe pôr isto como deve ser, outra vez. Se não lhe doesse a si, eu dava-lhe aqui umas pancadas e mais uns anestésicos e ficava como novo, mas está a ver, não pode ser.

Por isso é que eu o vim consultar, disse ela. Queria o melhor especialista.

Isso pode ter a certeza que sou, mas olhe, está mesmo num mau estado…não tem tomado conta dele em condições pois não? Não diga nada, eu estou aqui a ver. É sempre a mesma coisa, só cá vêm quando já está tudo quase sem arranjo. Mas eu vou fazer o que conseguir.

A rapariga agradeceu numa voz sumida. Sentia-se agora um bocado longe e dormente, como se a preocupação que a tinha ali levado, àquela oficina, garantida por toda a gente como a melhor, se estivesse a diluir muito lentamente.

Não faça isso, acorde, alertou-a ele. Tem que estar atenta! Veja lá isso que não posso estar sempre a chamá-la! Se se deixa dormir isto aqui pára!

Ela deu um salto e o sangue começou a correr com mais força. Fez pressão e ele avisou que era melhor assim, mas para se manter calma senão aquilo desatava aos saltos e era impossivel depois fazer o diagnóstico.
Prosseguiu com o exame.

Olhe aqui, está a ver esta parte? Tudo entupido! Mas como é que vocês deixam isto chegar a este estado, eu não percebo mesmo. Tudo mas tudo entupido! Já viu isto? Sabe o que é isto? Ah pois claro, não sabe, pois não sabe, por isso é que os deixa assim a entrarem desta maneira. Olhe bem para esta porcaria! Isto é um inferno dos grandes para limpar e olhe que nem sei se se consegue tudo, se eu lhe metesse um ácido, claro, era fácil, mas e o resto? Ficava tudo carcomido, vou ter que lhe, olhe nem sei bem! É dos piores que me passaram pelas mãos. Mas você não sabe mesmo? Olhe lá bem para este bocado, ainda se vê bem…ah pois é! Claro que é um desgosto! E este aqui? Do mais negro que já vi. Já viu que pegajoso? Isto cola-se a todo o lado! Você faz colecção estou a ver. É que tem aqui desgostos sabe-se lá de quando. Eu vou dizer-lhe: isto vai ser mesmo muito complicado limpar esta, desculpe lá o termo, merda toda.

Por isso é que vim ao melhor especialista coraçãozeiro, respondeu a rapariga.

Pois pois, mas isto assim não vai ser possível. Olhe vai ter que o deixar cá. Eu sei, é pedir muito, é uma grande maçada para si agora andar por aí sem coração, mas também, olhe, no estado em que ele já estava, sinceramente lhe digo: ninguém nota. Eu colo a pele e fica como nova. Volte cá para a semana que eu entretanto vou ver o que posso fazer.
E não se deixe entorpecer.


As mais-valias do peixe frito (com arroz de cenoura)

(o arroz de cenoura está ali no título, como no prato: só para servir de acompanhamento)

Não é que eu não goste de pescadinhas de rabo na boca. Gosto imenso, na verdade. Pelo-me por aquilo, como aliás me rendo a todo o peixe frito, com especial destaque para a petinga.

Mas pescadinhas de rabo na boca porquê? Isto tem alguma lógica?
Vejamos:
está uma criatura qualquer na cozinha, com uma trabalheira doida, a agarrar nas pescadinhas, a torcê-las e a enfiar com os rabos nas bocas dos peixes. Depois o resto, temperos e fritura e prato. E um gajo olha para aquilo, anda ali às voltas a tentar tirar o rabo de dentro da boca e a tentar arranjar um peixe que está com as espinhas todas tortas e fora de sítio. Palavra que não percebo a lógica disto.

Não há ninguém que explique que se podem fazer pescadinhas de rabo na boca sem realmente terem o rabo na boca? O rabo na boca acrescenta alguma coisa de relevante?

São as mais-valias. Pois é.