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A licença de maternidade

O João Miranda coloca um post no seu Liberdade de Expressão que tem por título Pessoas estéreis ajudam mães portuguesas. O tema é também seguido pelo Rui MCB do Adufe e pelo Leonel Vicente do Memória Virtual. Trata-se ou tem como ponto de partida a discussão do aumento das licenças de maternidade de 4 para 5 meses e a discriminação das mulheres no seu papel de mãe.

Aqui nesta tasca não se costumam discutir assuntos sérios. Remeto-os para almoços e jantares de amigos. Como já referi, conversar através da escrita demora tempo e pode criar mal entendidos. Mas abro aqui uma excepção.

Para começar, na minha opinião, e independentemente de eu considerar que a baixa de parto deva ser ou não de x meses, penso que o leque de opções deveria ser alargado: para além da baixa de parto, deveriam existir outras possibilidades, por exemplo, trabalho em part-time com respectiva redução da remuneração, horários flexíveis, licença sem vencimento sem prazos mínimos fixos . creio que, neste momento, apenas se podem tirar licenças sem vencimento por prazos sucessivos com um mínimo de seis meses – , enfim, uma maior escolha de alternativas para quem quer ficar mais tempo com um filho em casa. Como o Leonel Vicente diz no seu post, o papel de mãe tem de ser necessariamente compatível com a carreira profissional, trata-se, pois, de criar as melhores condições possíveis, com todas as alternativas viáveis para que essa situação possa ser possível.

Pois é, mas a realidade não é essa. O João Miranda não tem ilusões sobre o assunto e penso que ninguém tem. A maternidade constitui um factor de discriminação no trabalho, seja no facto consumado, seja potencialmente. Uma mulher em idade de ter filhos não tem uma carreira semelhante a um homem com a mesma idade. Muitas vezes é vista como .não vale a pena apostar neste elemento porque, daqui a uns tempos anda aí com baixas de parto, horários reduzidos, baixas de apoio à família, gripes infantis, horários dos infantários.. Claro que é verdade, todas essas condicionantes surgem com a maternidade e as prioridades mudam. O filho não pode passar sem apoio e o trabalho pode ressentir-se desse facto. Por isso é que defendo que devem existir todas e mais algumas alternativas para que seja possível conciliar o trabalho com o papel de mãe.

Note-se que tenho aqui falado sempre no papel da mãe. Infelizmente, continua a ser assim na grande maioria dos casos. A responsabilidade dos filhos cabe às mulheres, como se ainda estivessem em casa a criá-los. A sociedade altera-se mais rapidamente que os conceitos sociais e a mãe continua a ser .a mãe., apesar de exercer uma actividade profissional como .o pai.. Não havendo forma de mudar essa maneira de pensar .à chapada. (penso que só o tempo é que resolve essas coisas e talvez daqui a uma geração ou duas de filhos de mães que trabalham se comece a alterar a maneira de pensar da generalidade das pessoas), há que criar formas possíveis para minimizar os resultados da discriminação. Fazer de conta que não existe é que é um caminho errado. As excepções à regra são isso mesmo, excepções.

Na minha opinião, o título do post do João Miranda (Pessoas estéreis ajudam mães portuguesas) é um pouco infeliz. Sendo infeliz é, no entanto, sintomático de uma certa atitude perante a maternidade, um lapso inconsciente na escolha das palavras.
Não há ajuda às mães portuguesas. Há ajuda aos pais e às mães. Para que conste, a licença de maternidade pode também ser tirada pelo pai.

Talvez seja tempo de incluir os pais nestas coisas…

0 thoughts on “A licença de maternidade

  1. Mar

    Tem graça que ainda há menos de uma hora, aqui, repeti estas mesmas considerações, quando me perguntavam se estava de acordo com as comemorações do dia 8 de Março, se as mesmas continuariam a fazer sentido, se não seriam elas próprias uma espécie de discriminação da mulher, se não deveria também existir um Dia Internacional do Homem.
    Não sou feminista convicta (acho os soutiens uma coisa muito útil ;-))) mas que a igualdade é uma miragem, lá isso…

  2. catarina

    Eu acho que o Dia da Mulher, as quotas e quejandos são completamente discriminatórios. Os soutiens acho úteis embora não seja apreciadora, passo o tempo a torcer-me e a puxar pelas alças mas isso é falta de hábito. Quanto à igualdade, é a miragem total. A frase ‘eles deviam ajudar mais’ faz-me alergia. Eles não têm de ajudar. Eles têm de fazer a parte deles. Se não querem mudar fraldas e também não sustentam as mulheres que mudam fraldas como faziam os pais e os avôs, ao menos reconheçam que alguém tem de mudar as fraldas. E para mudar as fraldas é preciso criar condições.

  3. Rui MCB

    Não podia estar mais de acordo, Catarina. Aqui também defendo todas as excepções e que sejam ambivalente: para pais e mães, como escrevi no Adufe aqui há atrasado quando andei às turras com o João Miranda da primeira vez. Mas o João nesta matéria parece-me um caso perdido… Prometeu responder a argumentos do género dos que aqui expões mas não cumpriu e agora regressa com a pior propaganda possível (novamente).

  4. Maré

    Nem mais Catarina! Tiro o chapéu. A acrescentar só mesmo que este assunto, no fundo é o fulcro de muitas outras questões, verdade? Eu sou suspeita para dar a minha opinião, por mim a licença de maternidade está longe ainda do que deveria ser para que muitas crianças se desenvolvessem rodeadas dos cuidados maternais e paternais a que têm direito. Um ano com um semestre para cada um já me consolava. Mas eu sou sonhadora!!!! Já lá vai o tempo em que muitas mulheres se tinham que apresentar ao serviço 3 dias depois do parto. Eu assisti a essa quase castração que aconteceu com a minha mãe por altura do nascimento das minhas irmãs. Esperemos pois que se continue a evoluir. Beijinho