100nada

Sobre a fotografia (por uma leiga)

A diferença entre um fotógrafo e uma criatura que, como eu, aponta e dispara tanta vez uma máquina digital que alguma vez há-de sair uma coisa bonitinha, é qualquer coisa que fica para além da técnica (pum, levo já com um prego numa mão; mas prossigo mesmo assim) embora (isto agora tentando sacudir o prego que ainda não está bem preso) admita com a humildade total de quem é a feliz proprietária de uma máquina fotográfica so-called ‘das boas’ e que é totalmente manual, o que quer dizer que, ao fim de de vários rolos invariavelmente revelados a preto ou a branco (mesmo sendo rolos que diziam a cores na embalagem), desisti desse rumo e dediquei-me a outros bolos menos complicados e mais automáticos – e já me perdi, dizia eu então que – embora admita que aquela coisada toda das aberturas e das velocidades seja imprescindível à fotografia

(Abro aqui mais um parênteses, porque este post é escrito depois de algumas conversas com quem sabe da coisa e uma dessas pessoas, que entre outras coisas, é um excelente fotógrafo e pintor e que eu não posso aqui dizer que é meu cunhado por causa da privacidade e essas coisas todas, considera que a fotografia digital não é fotografia: é outra coisa; é, se se quiser chamar, fotografia digital ou outro termo, mas não é fotografia. Isto é que deve ser o purismo ou assim, mas eu gosto sempre de harmonia familiar e nem discuto o que não sei: só escrevo posts sobre o que não sei…e não sei se, em certos casos, não será fotografia também, a que é digital (não a minha, obviamente, mas por exemplo a dele, se acaso usasse uma máquina digital). Isto um bocado na dúvida de a máquina (a parte mecânica ou tecnológica da coisa) ser apenas uma ferramenta para transmissão de uma imagem, ou ser/fazer parte da construção da imagem. E, ao escrever esta última frase, percebo que provavelmente encontro aqui uma espécie de resposta, embora seja um conceito que a mim me custa entender, já que tenho uma relação com este objecto que é externa, instrumental apenas, útil para um único fim, o de captar um momento que a mim me interessa não como belo, mas como recordação. Fim deste parênteses, e já me perdi outra vez.)

(…) imprescindível à fotografia, e depois de um telefonema (este post está a ser escrito em tempo real) aparecem mais palavras como ‘enquadramento’ e ‘ângulo’ e outras coisas assim que eu entendo o que sejam mas não sei o que são e nunca mais consigo chegar onde queria que era ao outro lado.

Por mais técnicas que alguém domine, todas e mais algumas, continuo a achar que isso não faz dessa pessoa um verdadeiro fotógrafo. Esse, o técnico das velocidades, luzes, enquadramentos e catrefadas de outras coisadas, pode tirar fotografias boas. Mas isso não é a mesma coisa que boas fotografias. Para isso falta a parte que me parece a mais importante de todas: a imaginação, aquele bocado de cérebro/visão/criatividade, a capacidade de deixar quem vê essa fotografia

(em tempo real acabo de ler um comentário no post abaixo. Curioso, é isso mesmo)

de boca aberta (agora atrofiei, mas roubo uma palavra ao tal comentário, elemento-surpresa, obrigada, Onan)

é isso.

Para acabar, deixo propositadamente no fim deste post uma fotografia. Para ficar por cima da minha e para que se veja aquilo que acabei de escrever. É de Gerard Castello Lopes. (daqui)

0 thoughts on “Sobre a fotografia (por uma leiga)

  1. Onan

    Ora aí está: a perspectiva estranha, o gaveto, as sombras, as pessoas alinhadas como se fossem muito certinhas para lugar nenhum, a luz, a sombra estendida do fim de tarde, o estranhíssimo brilho nos passeios, as figuras geométricas, a estranheza dum mundo a que pertencemos e no qual nos custa reconhecer, os automóveis que passam (para onde?), os automóveis estacionados (para quem?), um braço estendido, a fila quase indiana, o lado esquerdo mergulhado numa sombra de que não conseguimos ser cúmplices, a perspectiva quase anómala, o ziguezaguear da linha de sombra em primeiro plano, uma angústia que se depreende, uma respiração difícil, as janelas fechadas, um corpo insinuando-se, apenas pela metade superior, como se fosse instaurar a desordem ou partilhar dessa pérfida montagem – a ausência, o desconsolo, a vertigem, a falta de ar, a sufocação: está lá quase tudo. Isto parece-me, sim, uma fotografia.

  2. mana

    Ora deixa lá ver se ainda consigo dizer tudo até ao fim, que está para o tarde.
    O argumento é do autor da fotografia que mostras: defende que é uma imagem que está ligada a uma técnica, que a pressupõe – a impressão, através da luz, sobre um papel fotosensível. Tem uma dimensão determinada pelo seu autor e a sua reprodução não é fotografia, é reprodução por outros media, tal como a reprodução de uma pintura não é uma pintura. a discussão existe em outrs áreas, tal como na gravura, em que têm sido incluídos sob a mesma designação processos que nada têm a ver com o acto de gravar. Não é uma questão que pretenda desvalorizar essas imagens, apenas designá-las de outro modo. Tal como vídeo não é cinema. Sendo exibido em museus de arte contemporânea, ao contrário do outro. Frequentemente o que os próprios produtores artísticos muitas vezes definem como uma arte menor, passa a ser dominante no mercado artístico, como foi o caso da fotografia e do vídeo.
    (agora a tomar folego)
    :)) o telefonema. Enquadramento, ângulo e luz e essas coisadas todas são decisões, sendo por isso actos criativos e não domínio técnico. Domínio técnico supõe que tu saibas explorar o potencial da tecnologia que utilizas. Criatividade é fazê-lo de um modo que seja preponderantemente característico de quem o faz. Diferente do que outros já fizeram. Que põe alguns a pensar, dão a outros uma subtil felicidade, afectam a tua maneira de ver. Etcetera. Até pode ser feio.

  3. mana

    Faltou-me ali uma parcela: … são decisões determinantes na construção da imagem, sendo… (e por aí fora)

  4. L.G.

    Catarina, será que vais ter comentários depois deste dois?! Alguém terá coragem de acrescentar seja o que fôr???

  5. L.G.

    Como tinha ficado sem palavras, quanto à lindíssima foto que ali deixaste, não vou ( não posso ) dizer nada.
    Uma coisa pessoal: Adoro tudo o que seja artes plásticas. Pessoalmente sou incapaz de desenhar para além da capacidade de uma criança de 3 anos, – talvez consiga fechar um círculo mas pouco mais – mas tenho alguns quadros bons, e se fosse rica teria muitos mais. Quanto á fotografia também apreciando sou completamente inibida. O meu pai era fotógrafo amador, tinha câmara escura e tudo, e sempre achei que não poderia competir com aquela competência. De modo que nem tento. Faço como na pintura e sento-me a apreciar!

  6. Sara Jofre

    Essa coisa dos fotógrafos dizerem que a fotografia digital não é fotografia só me lembra aquela coisa dos psicólogos dizerem que os anti-depressivos não fazem nada à depressão que o faz é a psicoterapia e não sei quê.
    Pois, os fotógrafos sentem-se ameaçados pela fotografia digital. Agora qualquer caramelo com o mínimo de jeito pode tirar grandes fotografias e os psicólogos, como não tiveram média suficiente para serem médicos e, se calhar, até tiraram o cursinho numa privada, sentem-se abispinhados porque os psiquiatras é que podem tratar e eles têm de limitar-se a uma série de palavreado e frases feitas… (que os psiquiatras também podem usar)… pronto, é só uma comparação… enfim…

    O post era sobre o quê mesmo?

    Vou tirar o cocó do rabo da miúda…

  7. vovozinha

    Prefiro 1000 vezes uma fotografia cheia de imaginação e sem nenhuma técnica do que uma cheia de técnica e nenhuma imaginação. O elemento surpresa esse é difícil, muitos profissionais passam a vida e muitos rolos depois, à espera “daquela imagem” que corre Mundo e perdura nos tempos. A perfeição aqui como em qualquer outra arte é difícil de alcançar afinal não é todos os dias que aparece um Cartier Bresson, mas também quem precisa de um para recordar as últimas férias?
    Lembro-me que quando andei “apanhada” pelo tema em questão, demorava tanto tempo a tirar as fotografias aos meus filhos que eles já estavam mais velhos quando eu acabava, também me rendi Digital, estou sempre em cima do acontecimento o que se perde em qualidade ganha-se em espontaneidade.
    vovozinha

  8. isavieira

    “Ser ou não ser, eis a questão” – Shakespeare deu-nos a deixa e eu vou apanhar boleia. Uma fotografia digital é ou não 1 fotografia? Esta questão tem sido muito debatida e irá fazer correr, ainda, rios de tinta. No meu rio já não há grandes ondas. Uma fotografia é, acima de tudo, LUZ. É a captação de um momento único registado pela luz. E, nesta vertente, quer as máquinas analógicas, quer as digitais me proporcionam esse registo. Os suportes de impressão é que mudam. Cartões, cd’s, dvd’s e papel fotosensível(este último ainda é o nosso preferido porque nos permite exibir rapidamente a imagem da nossa cara-metade, ou babarmo-nos para cima da foto do nosso amado filhote…)arquivam as imagens do nosso contentamento e, tb, do descontentamento hehehehe. A fotografia sempre foi uma das minhas paixões. Percebê-la e viajar através da sua arte tem sido fonte de um enorme prazer partilhado. Pertenço ao grupo daqueles que dá umas clicadas (ora na nalógica ora na digital) com alguma arte e engenho (modéstia à parte). Umas vezes faço-o por questões profissionais, outras por simples amor à arte e são, sem dúvida, as últimas que mais podem dizer de mim, porque são as que retratam maior emoção, criatividade, amor, visão, espontaneidade e sensibilidade. São estes os registos que maior relevo adquirem. As outras, as profissionais são mais técnicas, mais racionais, mais pensadas no objectivo a alcançar. Claro, que nelas tb coloco grande parte da minha sensibilidade, mas há uma responsabilidade acrescida que, quer queiramos quer não, acaba por ser limitativa.
    Quanto ao facto de se ser ou não fotógrafo… Catarina uma ‘so-called’ boa máquina não faz um bom fotografo, mas a tua sensibilidade (que eu sei que tens às carradas), a tua perspectiva e noção de perfeição vão sempre garantir boas chapas :op.
    Sobre a fotografia podíamos fazer algumas teses, mas acho que já estou a ficar uma seca, por isso deixo um convite
    http://www.1000imagens.com/autor.asp?idautor=555 Além de uns bonecos que fiz, poderás visitar galerias de autores (profissionais e amadores) que expõem as suas telas iluminadas pela sensibilidade, desenhadas pela cor da vida e arqivadas na memória da Imagem. Epá acredita que, depois desta visita, o conceito de ‘fotografia’ nunca mais será a mesmo! :)**
    Isa

  9. mana

    Sara, os psicólogos não são pessoas que não tiveram média para entrar em medicina e, de resto, os psiquiatras também optam pela aplicação da psicoterapia. Há mesmo muitos psiquiatras que raramente prescrevem fármacos aos seus pacientes e se dedicam quase exclusivamente à psicanálise ou terapias de grupo, etc.
    Aquilo que eu gostava que percebessem é que a discussão entre a pertença a uma designação não implica um juízo de valor em que por comparação se pretende que a imagem digital seja inferior. É evidente que uma máquina sózinha não faz boas fotografias. E, por outro lado, que até acidentalmente saem imagens giras, com qualquer das tecnologias (basta ver os resultados de uma série de imagens tiradas por uma criança pequena com uma máquina descartável). E há aqui uma confusão entre duas discussões que são distintas e aparecem sobrepostas: uma coisa é determinar se incluir a imagem digital no âmbito da fotografia é legítimo; outra é essa espécie de oposição entre técnica e criatividade, que é absurda, por ser uma complementaridade e não uma oposição. E tanto a máquina tradicional como a digital pressupôem o uso da técnica e o da imaginação (que é efectivamente um território onde é mais difícil surpreender, mas igualmente acessivel, porque toda a gente tem imaginação).

  10. Sara Jofre

    Mana… eu não disse o contrário. O que disse, assim trocado por miúdos, é que o psiquiatra pode fazer o mesmo que o psicólogo clínico e o psicólogo clínico não pode fazer o mesmo que o psiquiatra. Se um doente precisar de terapeutica farmacológica o psicólogo não pode fazer nada porque não é médico (mas, infelizmente, muitas vezes insiste numa psicoterapia ou psicanálise só para não perder um doente e prejudica uma pessoa que, com fármacos, ou com terapia combinada, seria curada mas, para isso, precisava de um médico)… E não me estico mais na discussão porque o post era sobre fotografia que é outro tema que muito aprecio 😉 😛

  11. mana

    Ora pois pois, mana! lanças a discussão e depois descartas-te airosamente…

    Sara, tudo bem, eu só achei que aquela da média era um bocado precipitada. De resto o recurso a fármacos não dispensa acompanhamento e tenho a certeza que os psicólogos também sabem avaliar se um paciente precisa desse tipo de tratamento, remetendo-o, nesse caso, para um psiquiatra.

  12. L.G.

    Como o post era sobre a fotografia e sobre isso já falei, tenho algumas dúvidas sobre se vale a pena dizer uma coisa ou duas à Sara que deve ter tido uma má experiência com um psicólogo. Olha, acredita que há bons e maus psicólogos, bons e maus canalizadores, bons e maus professores, bons e maus médicos, bons e maus artistas, etc….Mas a psiquiatria é uma especialidade da medicina, a psicologia clínica uma especialidade da psicologia. Não é a mesma coisa. Se, pelo que entendo, falas em psicoterapia, isso exige uma formação especial. Um psicoterapeuta pode nem sequer ser psiquiatra ( conheço uma que é anestesista, outra assistente social, ou enfermeira, ou…) mas deve ter essa formação e começar por trabalhar com supervisão. Se o não faz, tenha que formação tiver, está cometer um erro.
    [ a ideia de um especialista a “não querer perder um doente” é de arrepiar, Sara. Se sabes de um caso desses devias denunciá-lo ]

  13. saltapocinhas

    As fotografias servem para marcar um momento, normalmente um bom momento (não é costume, ver ninguém a fotografar momentos tristes, a não ser os jornalistas)
    Por isso eu tiro milhentas fotografias a tudo o que mexe, ou porque gosto ou porque me apetece e além do mais é de borla. Essas discussões filosóficas ficam para os profissionais que -digo eu- nunca hão-de chegar a nenhuma conclusão!
    E deixo a pergunta: uma fotografia toda modificada no photoshop ou algo que o valha é uma obra de arte? Pode ser uma obra de arte como um quadro, ou uma cadeira, ou um sofá, mas é uma fotografia?

  14. Photo-grapher Wannabe

    Os primeiros posts eram interessantes, mas essa dos psicologos vs psiquiatras e fotografia vs digital, lamento, mas são ideias ridículas.Sobre os psicologos já o suficiente foi dito. Quanto aos fotógrafos se sentirem ameaçados pela fotografia digital…não faz sentido. Um fotógrafo é uma pessoa que domina as técnicas necessárias para captar um determinado objecto, ou seja luz, em traços gerais, e registá-lo num determinado suporte físico: Analógico ou Digital, depende apenas da escolha de material de cada um e não faz sentido que um fotógrafo se sinta ameaçado por uma técnica ou pelo material. Mas que a verdadeira fotografia tem outro sentimento,outra magia, isso tem. (PS.A referencia escatológica ao ‘rabo da miúda’ foi um bocado pornográfica :/

  15. RG

    Sara to a ver que desconheces a realidade da Psicologia e falas com toda a segurança dakilo que não conheces! O que tu dizes são.. Deixa cá escolher uma palavra soft… Asneiras! Humm.. Será que noto nas tuas palavras uma pontinha de frustração? (…)

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