100nada

Yet another twitter wiki (Twitter para totós e outros)

Cansada de explicar “O que é (afinal) esse tal twitter?”, aqui vai o post há muito adiado, para totós, loiras e outras pessoas absolutamente normais que não perceberam ainda o que é (devem ser talvez dez ou assim).

O que é o Twitter? Se eu escrever que é a web ponto 2 ou 3 ou qualquer coisa do género, rede social, networking, ficam na mesma, não é? Claro que ficam, ninguém sabe bem o que isso é. Mas se eu disse que o Twitter é um coiso para conversar com outras pessoas, ah já faz sentido, não é? Pois lá está. O Twitter é uma espécie de IRC do século XXI, mas para crescidos, onde toda a gente diz coisas e as outras respondem a essas coisas ou não respondem, enfim, um sítio para comunicar.

O melhor é ir ver como funciona: muito simples, ir ao Twitter e abrir uma conta. “Mas e meto mesmo o meu nome? e a minha fotografia?” são coisas que me perguntam imenso e o que posso responder é que façam como entenderem (podem mudar depois) mas o twitter está mais respeitável do que era há um ano e toda a gente usa o nome e a sua pic. Eu uso o nome de início, da boneca do SL e não mudo por questões sentimentais, mas está lá o meu blog e quem quiser saber, vai ver.

Aberta a conta, entram numa página que pergunta “what are you doing?” e respondem logo “olá mundo! tou no twitter finalmente! cheguei! estou cá, olá a todos!” e é provável que ultrapassem os 140 caracteres e aquilo avise que se tem que respeitar esse limite. Ah pois é. O twitter serve para conversar em 140 caracteres de cada vez. Chato, eu sei, principalmente para toda aquela gente que, podendo dizer em três parágrafos o que se pode dizer numa linha, prefere a primeira forma, mas terão que aprender a resumir ideias. Isso mesmo, não é para todos. Daí que não se vêem por lá alguns dos bloggers políticos mais prolixos e aqueles todos poético-manhosos. Não serve. Ali, só conciso e direito ao assunto.

Bom, estamos na parte em que orgulhosamente se anuncia ao mundo que se está no twitter. Só que o mundo (lamento imenso mas é mesmo assim) está-se completamente nas tintas. É uma frustração, sim, mas não é porque o mundo não queira saber: o mundo não sabe que aquela pessoa entrou no Twitter. Ora olhem lá para aquele canto acima à direita, onde diz “following_me” e “followers”. Está tudo a zeros? Claro. Ninguém sabe que entraram no Twitter. Há que ir à procura das pessoas.

Os “followers” são as pessoas que nos adicionam às suas listas e nos lêem. Os “following_me” são aqueles que nós adicionamos à nossa lista porque queremos ler o que estão a escrever. Não é necessariamente uma relação recíproca, portanto não fiquem tristes se estiverem a falar com alguém que nos vos liga: provavelmente não vos está a ler. Mas se colocarem uma arroba e o nick dessa pessoa antes do que estão a dizer, ela vê essa reply. Convém também consultarem as vossas replies de vez em quando, porque pode estar gente a responder-vos, mas já me adiantei.

Então como é que se encontram as pessoas? Bom, uma parte delas está aqui, no Twitt Portugal e podem ir lendo o que escrevem e clicar nos nomes se as quiserem seguir. Outra hipótese é irem cuscar os contactos do @PauloQuerido, que tem tudo ou quase. 😉 E, claro, se querem ir para o Twitter, é porque alguém vos falou nisso ou porque os vossos amigos lá estão, é ir à procura deles e cuscar os contactos. Provavelmente terão lá outras pessoas que conhecem. Seguir gente é muito simples.

Já serem seguidos, para lá dos vossos amigos ou de curiosos que querem saber que tal é que vocês são, pois têm que ser minimamente interessantes. Ou encontrar um nicho de mercado de Twitter. É provável que se conversarem sobre chocolates, máquinas de lavar ou política, terão os vossos seguidores que também gostam de conversar sobre esses temas. O meu conselho? É sempre o mesmo, seja em blogs ou redes sociais: sejam vocês mesmos. Não vale a pena armar ao pingarelho, muito menos em 140 caracteres. Não vale a pena tentar falar de qualquer coisa que nem vos interessa muito, só para terem mais audiência. Alguém saberá mais de certeza e vai dar-vos cabo das orelhas. Aquilo só vale a pena se der gozo, se gostarem, se tiverem entusiasmo. Isso sente-se. Se parecer chato ao princípio, valerá a pena insistir um bocadinho; se continuar a ser seca, ou confuso, ou muito rápido (é, rapidíssimo), se o ritmo não for o vosso, então melhor prosseguir com o blog ou o zapping da televisão. Ou ficar pelos dez contactos de amigos e ir conversando com eles. Twitter high profile não é para todos, cof cof.
Serem bem educados também ajuda. Mas isso escuso de dizer aos meus leitores, como é evidente.

Depois, quando lá estiverem e acharem que aquela página da web é do século passado e é uma porcaria, alguém vos falará de clientes para Twitter. São programas que gerem os tweets e são mais simples de utilizar. Há montanhas deles, é ir experimentando até encontrar um que sirva.

E, antes que me voltem a perguntar o que é um RT, eu explico já: é Re-Twittar um tweet que achámos interessante com referência ao autor.

Agora vão lá ver. E depois digam-me lá se não gostam. E se não ficam muito mais rápidos. E se não ficam viciados. E se não estão agarrados ao Twitter.
Pois é.


Nunca me lembro do que escrevi

(repost)

Uma fotografia

de uma rapariga que entra na Expo em 1998.

É uma noite de Julho, 19 de Julho. Não tem nada, essa data, nada, mas fixou-a, sabe que era 19 de Julho de 1998. E estava uma noite quente como só Lisboa à beira rio consegue ser, quando não há vento, apenas uma aragem vaga e doce no fim de tarde ainda dia. A rapariga tem cabelos ruivos, talvez, talvez compridos, já não se lembra bem. Lembra-se do que levava vestido, a camisa favorita, só tem camisas brancas esta rapariga, não lhe interessa se estão na moda ou não. Esta não tem mangas e deixa à mostra braços tão brancos como a camisa ou mais ainda, não é uma rapariga amiga de apanhar sol. E os cabelos são compridos, lembra-se agora, porque o vento os levantava e a rapariga entra na Expo pela porta Norte no meio de gente gente gente e à volta tem três amigos, que ainda tem agora, amigos de vinte anos de jantares, alguns jantares especiais de natais, não esses, mas outros, jantares de três amigos com a mesma rapariga, de coisas e coisas e coisas que aconteceram, de chaves esquecidas nos carros na 24 de Julho e xixis feitos ali ao lado em árvores meio escondidas e se vocês fazem eu também faço, estás doida mas eu tapo, em madrugadas acabadas em batatas fritas dentro de pão de cachorros quentes e não comam a salada que isso é que cai mal, não são os copos…e a rapariga entra na expo e vai jantar com os três amigos ao cimo da Torre Vasco da Gama e apanham todos mais uma das grandes entre whiskies e champanhes e acabam todos a fumar cigarrinhos para rir ali no meio do restaurante e ninguém acha mal e a rapariga sabe que todas as mesas se perguntam o que é que está ali a fazer uma rapariga num jantar de homens e ela ri-se e sabe que todas as mulheres presentes gostariam de ter os mimos de três amigos como ela está a ter. E também sabe que todos os homens estão a apostar qual dos três é que irá para a cama com aquela rapariga ruiva. Não percebem nada de amizade, os espectadores das vidas felizes.

(post de Set.2004)


Espanta-espíritos

Vim assim a pensar devagarinho
(sei que é tão tarde e eu a querer tanto roubar as horas ao sono para escrever hoje, não sei a razão, porque tem que ser, imagine-se que depois já não escrevia, tem que ser hoje)
devagarinho e aqui, sim, porque não, uma vez só de vez em quando

a pensar devagarinho, em bicos dos pés (como quando não os queremos acordar a meio da noite)

já sobram pernas e braços e ainda se aninha em abraços de colo porque é um rapaz ainda pequeno, que dá a mão à mãe na rua sem vergonha, embora já não chore quando bate com os pés e os cotovelos nas portas quando passa a correr, e me diga

(e é por isto que escrevo hoje e aqui)

se eu morrer antes de ti

(eu sobraçava)

depois ficas cá e eu fico aqui e aqui e aqui

e coloca o indicador na minha testa e no meu coração
e o terceiro aqui é ele a rir-se muito no meio da sala.





Pairar ou aparvalhar

Não me lembro (digo-te já) e é por isso que (te) falo desta forma desligada, como se tivesse acontecido a outra pessoa (era outra pessoa) porque é isso que acontece, somos aquela pessoa e depois deixamos de ser. E é por isso que
é preciso cristalizar aquela pessoa naquele momento
porque depois deixa de ser. Claro que deixa de ser também pelo momento em si e essa parte é um violento deixar de ser e um gajo nunca sabe se, não tivesse acontecido aquele momento, deixaria de ser, lá está, provavelmente seria um longo processo de erosão (esse é inevitável, as pessoas vão-se partindo e colando os bocados de outra maneira, acrescentam aqui e ali, emendam falhas, até se desfazerem) mas
nunca percebi aquela necessidade de cristalização até (me cristalizar lá atrás) (me) ter acontecido a outra pessoa, que era eu mas agora já não era.

(olha sabes) quando dizemos “quem me dera que o tempo parasse aqui e agora?”
é isso mesmo. Pára ali e naquele momento.

Mas nós (infelizmente? felizmente?) não.


Até já posso ter escrito isto

(estamos sempre a escrever as mesmas coisas)

o espaço agora preenchido (quase custa a acreditar) era vazio e eu
(abraçada às paredes)
descalça deitada no chão deitava mais gelo no copo
(tinha copos)
não sei de onde vinha o gelo mas havia
(agarrada às paredes)
o som espalhava-se pelo jardim
(ainda tenho aquela mini aparelhagem, agora na cozinha *)
e o verão entrava pelas janelas abertas

*porque agora sou mais bolos.


Dois em um

Sempre que oiço aquilo, lembro-me. Não é uma recordação nítida como um postal ilustrado. Para ver o desenho tenho de me esforçar. Mais como uma mancha na memória, sobre a qual é necessário aproximar o olhar até conseguir distinguir as formas.

Oiço o eco nos prédios em redor e, por momentos, a direcção do som escapa-me, até conseguir localizar o telhado vermelho, o muro de rede, as cores mais alegres de um escorrega. O recreio da escola primária, à hora a que os meninos brincam. É uma música desafinada, um coro de vozes infantis, um caos de gritos e risos, que misturados soam sempre da mesma maneira, seja em que escola for, seja em que ano for.

Faz-me dores de cabeça. Ou faz-me a recordação de dores de cabeça. É a primeira coisa que distingo na mancha da memória, a cabeça a doer, a tentar pensar, a tentar erguer-se de uma almofada que não conheço…

…estou deitada dentro de um aquário. Lá fora, os peixes gritam e riem-se atrás de uma bola, a descer por um escorrega, a discutir a vez nos baloiços. Cá dentro, a luz branca que passa entre as portadas da janela transforma-se num tom verde e baço, um aquário cheio de limos e cantos escuros, o som do recreio filtrado pelo silêncio do sono. Não consigo voltar a adormecer, esta almofada que não é minha não me alivia a dor de cabeça. Não sei se é do som dos peixes pequenos lá fora, se do único fio de luz branca que brilha entre o verde baço, directo à minha almofada, se bebi muito ou dormi pouco, nada faz ainda sentido senão o que sinto e o que sinto é a cabeça a doer cada vez mais. Café, penso eu, café já. Tenho tanta vontade que quase sinto o cheiro do café acabado de fazer, morro de vontade ver o fumo a sair da chávena, não quero nada mais senão aquele vago sabor amargo que quase desaparece na queimadura da língua.

Um dos limos do quarto verde (quem terá tido a ideia de pintar isto de verde? perguntarei eu mais tarde, depois de engolir duas chávenas, e respondem-me, já estava assim quando viemos para cá) dissolve-se e transforma-se num rectângulo de luz, recortado por uma figura que diz baixinho, fiz café agora mesmo, alguém quer? E o rectângulo de luz desaparece, sem esperar por resposta.

Levanto-me devagar, para não incomodar a cama e o dono. Encontro a roupa, visto-me e abro a porta. Um corredor comprido e branco, uma porta aberta ao fundo. Sigo o nariz até à cozinha e encontro uma chávena de café em cima de uma mesa. A outra está na mão de um rapaz que me sorri e diz ‘bom dia’. Não sei quem é, mas o café é irresistível. E no momento em que agarro a chávena e o desconhecido me estende um cigarro, penso, talvez me tenha enganado no quarto ontem à noite.

Ficamos em silêncio, os dois, um silêncio agora manso, os peixes acabaram o recreio. Lembro-me do aquário e pergunto sobre a cor, ele responde. Já me apetece perguntar mais, saber porque vieram os dois para esta casa, mas como nem sei quem são os dois, ou não sabia até ontem, até agora, prefiro ficar calada. E depois, é confortável este silêncio sem peixes, digo-lhe, ele ri-se, e pergunta, gostas? De quê? Digo eu. Peixe. Gostas de peixe? Se não berrarem logo de manhã, respondo e ele levanta-se e anuncia: vamos almoçar. Eu aponto vagamente para a porta, para o quarto-aquário, ele diz, cá em casa quem almoça sou eu. Ele só janta. Queres tomar banho antes de irmos?

[TrAmo-te, Psicologia Actual, 2007, não faço ideia do mês, logo vejo]

[na verdade era o princípio de um romance, mas oh well, já sei como eu sou, escrevi dois capítulos se tanto]


No semáforo vermelho

Passam pessoas. Nada de especial acontece, ou então o mesmo de sempre. Os tipos que estendem jornais, os que estendem a mão. Passam pessoas. Umas olham para a frente, outras para os lados, outras para as outras, outras para os carros. Uma velha muito lenta deixa cair qualquer coisa, curva-se para a apanhar. Uma rapariga solta o cabelo do casaco. Um casal discute se atravessa ali ou mais adiante. Uma mãe tenta subir o passeio com um carrinho de bebé. Dentro do carro as pessoas olham para a frente, para os lados, para as outras, para os carros.
E depois passa um miúdo. Mãos nos bolsos, nariz no ar. A olhar para cima.

Falta-nos a todos, adultos, um lado.