É certinho como o sol: nos dias em que temos pressa, saem todos os anhucas do volante à rua ao mesmo tempo. Pior: saem à rua primeiro que nós. E, daqui a uns quarteirões, lá damos com eles à nossa frente. Ali vai o carrão, marca xpto, com cento e não sei quantos cavalos e milhares de centímetros cúbicos e cilindros em vê e mais umas alcavalas, mas há-de ter sempre uma criatura que não ainda entrou no século automóvel e prossegue no tempo (e ao tempo) do carro de bois.
Para começar temos a velocidade. Qualquer boi anda mais depressa que aquela vaca (ou bode velho) que ali vai à nossa frente e nós a olharmos para o relógio do carro, para as horas no telemóvel, a ouvir o pi do sinal horário no rádio, a pensar mais valia ter comprado o jornal que sempre o ia lendo e, à frente e com toda a calma do mundo, lá continuam a rodar aqueles pneus largos mais as jantes de liga leve a menos de trinta, reduzindo para vinte nas curvas ou sempre que um carro aparece no sentido oposto. Uma pessoa rói-se, irrita-se, refila, sai-me da frente cabrão de merda! Mas que raiva logo havia de me aparecer este pedaço de anhuquice móvel, porque é que não me atravessei à frente dele ali atrás no cruzamento, tive que o deixar passar, burra que sou e o que vale é que vou agora virar à esquerda, ora então fazer o pisca
para continuar temos a ausência de quaisquer sinais. Não há piscas nos mercedes de bois. Uma pessoa a pensar que se livra da melga e a carraça a virar à esquerda sem fazer sinal. E lá continua ela à nossa frente e nós a mudar de frequência de rádio e nem a TSF dá notícias nem a A2 dá música nem a Capital dá o trânsito, tudo a correr mal e a caixa dos CD’s a espalhar-se do banco do lado para o chão do carro, de encontro à porta oposta. E depois, uma pessoa torcida a tentar apanhar a ponta de um cdzinho que seja, a descer pelo banco abaixo e a esticar-se toda e o cabrão trava e por mero acaso não tem
para continuar temos a ausência de quaisquer stops. Que isto da manutenção mercedes está cara e de qualquer forma como é que se sabe que não se tem stops se não se consegue ver, não é? O filho da mãe trava sem stops, nós travamos atrás a fundo e ficamos entre o espelho retrovisor a ver quem vai bater atrás e a carteira que entretanto foi fazer companhia aos CD’s e logo por azar estava aberta foda-se pa esta merda toda e o condutor dos bois parado no meio da rua e uma pessoa faz sinal para ultrapassar
para continuar temos a ausência de espelhos retrovisores. O velho de merda afinal tinha visto um lugar do lado esquerdo e estava só a tirar as medidas ao sítio para ver se a carroça cabia e lá vai ele a atravessar-se no meio da rua é só pode ser surdo às apitadelas…
Uff! Velho arrumado e enquanto suspiro de alívio, chego ao próximo cruzamento e paro no stop, aparece da direita, muito direitinho e a velocidade lição n.º 3, um carro de instrução…