Oceano Mar
‘O homem nem sequer se vira. Continua a fitar o mar. Silêncio. De vez em quando mergulha o pincel numa tigela de cobre e esboça na tela poucos traços leves. As cerdas do pincel deixam atrás de si a sombra de uma obscuridade muito pálida que o vento imediatamente seca trazendo de volta à superfície o branco anterior. Água. Na tigela de cobre só há água. E na tela, nada. Nada que se possa ver.
Sopra como sempre o vento do norte e a mulher envolve-se na sua capa roxa.
– Plasson, há dias e dias que trabalhais aqui. Por que razão trazeis convosco todas essas tintas se não tendes coragem de utilizá-las?
Isso parece acordá-lo. Isso atingiu-o. Vira-se para observar o rosto da mulher. E quando fala, não é para responder.
– Peço-vos, ficai assim – diz.
Depois aproxima o pincel do rosto da mulher, hesita um instante, encosta-o aos lábios dela e passa-o lentamente de um canto ao outro da boca. As cerdas tingem-se de vermelho-carmim. Ele observa-as, mergulha-as rapidamente na água e levanta de novo o olhar em direcção ao mar. Nos lábios da mulher fica a sombra de um sabor que a obriga a pensar “água do mar, este homem pinta o mar com o mar” e é um pensamento que provoca arrepios. ‘
Oceano Mar, Alessandro Barricco
para ti.
- Tempos novos
- NY Marathon
Não conhecia e confesso que fiquei impressionado, embora o texto seja curto.
Vou tentar ler, se conseguir encontrar nos escaparates.
Belíssimo!
Sempre belo, o Oceano Mar. Adorei reler essa parte. Beijinho grande, Catarina e muito, muito obrigada pela prenda.
P.S. Acácio Simões, o livro está esgotado até na própria editora. Ou pelo menos estava até há um mês atrás. O único exemplar existente foi comprado por um conhecido meu através dum site especializado em livros nessas condições.
Desejos de Bom fim-de-semana.
Obrigado pela visita 😉