O dia em que fui assaltada na praia de Ipanema
Era Dezembro e eu estava lá estendida numa toalha, a toalha não me lembro de que côr, mas eu branca da silva, o bronze do verão já desfeito (não mana, não digas nos comentários, qual bronze? tu detestas praia e nunca te queimas, ficas sempre à sombra, que isto é uma história e há que acrescentar alguns detalhes falsos mas asseguro que este é o único), a olhar para o céu e a pensar que a praia em Dezembro até se grama, enquanto o namorado da altura ia fazendo carreirinhas ou outra coisa qualquer à beira mar. Ao meu lado o guarda sol (claro, para a tal sombra acima referida) e uma mochila vermelha, onde estavam guardadas, ao lado do dinheiro-preço-do-assalto-para-não-levar-a-costumeira-facada-à-época-cinquenta-dólares e de maços de tabaco e garrafas de água, isqueiros e livros e outras coisas sem valor, as chaves do apartamento em Copacabana onde estávamos instalados. As únicas chaves num raio de milhares de quilómetros, os duplicados em casa dos donos em Lisboa. Dentro do apartamento teríamos os passaportes, dinheiro e travellers cheques, cartões de crédito e, embora um potencial ladrão não pudesse adivinhar a morada, também nós não teriamos hipóteses de aceder aos nossos bens, em caso de extravio das chaves.
Deitada de barriga para o ar, branquela da silva, eu e os meus 47 quilos de metro e sessenta de gente enfiados num biquini brasileiro, pois claro e aparece-me do lado direito um rapaz (um matulão mais precisamente), um admirador portanto, a perguntar as horas por gestos. Pensas que eu sou estrangeira mas eu tenho outro matulão ali em baixo a banhos e não te vou responder em português, penso eu e faço notar, também por sinais, que quem tem o relógio é ele. Ele desanda e eu, nesse preciso momento, vejo uma coisa vermelha passar-me pelo canto do olho do meu lado esquerdo.
Viro a cabeça e olho para o sítio onde está a mochila. Onde não está a mochila e o facto demora uns segundos a passar da parte ocular para a parte do cérebro em que se registam frases inteligentes como ‘onde está a mochila?’ e ‘onde está a mochila??’ e ‘onde está a mochila???’.
Quando os neurónios explodem e eu olho para o lado direito outra vez, para trás de mim, vejo o matulão que me perguntou as horas a correr pela praia em direcção a mais dois matulões. Na mão de um deles está uma coisa vermelha. Os neurónios explodem e eu também. Num milésimo de segundo estou sentada de boca aberta vagamente a pensar que se calhar me roubaram a mochila. No milésimo de segundo seguinte, ao som de um grito mental ‘as chaves de casa!’, estou a correr pela praia, eu e os meus 47 quilos em metro e sessenta de gente branquela, aos gritos reais de ‘filhos da puta de merda, devolvam-me já o meu saco, seus cabrões!’. Eu não sou muito grande, mas a minha voz ouve-se muito bem e deve ter sido ouvida pela praia fora até São Conrado. Os matulões (pretos e não me venham com a merda do politicamente correcto, mas lembrei-me desta história por causa dos 50 ou 500 da praia de Carcavelos) pararam. Ficaram à minha espera. Eu chego ao pé deles, sem fôlego da corrida e dos berros e o que tem a mochila, estende-ma e diz ‘a dona não a devia ter deixado cair ali no meio da areia’. Eu agradeço a amabilididade e arranco-lha da mão.
Volto para a minha toalha.
Nunca olhei para trás, sempre à espera da facada merecida que nunca senti, a praia inteira sentada a olhar para mim.
Sentei-me na toalha e finalmente olhei, eles estavam já muito afastados, muito longe. O namorado apareceu e disse ‘tudo bem?’ e eu respondi ‘sim, só fui a correr atrás duns ladrões para reaver o saco que tinham roubado e tu, incompetente, nem deste por nada!’ Entre os ‘repete lá isso, tás a gozar’ e as explicações, a única coisa que até agora (e já lá vão muitos anos) me faz sentido no meio desta história toda é que o elemento-surpresa foi aquilo que me salvou.
Isso e o meu feitio.
- Olha…
- Xicuembo
Quem rouba pouco é ladrão, quem rouba muito é barão.
Estes não roubaram nada, Bill.
(a deixar de fumar, hein? Já sabemos tudo!)
Quem não rouba nada, pega no que acha.
(O figé é bufo)
cof… cof …. foga-se Catarina, eu a ti, mesmo emprestado, hei-de pedir por escrito! (47Kg de voz disseste tu?)
Pela lei dos salvados, Bill?
(digamos que prestou uma valiosa informação sobre os leitores do meu tasco)
Não seria de estranhar, Eufigénio, já que esta comunicação é por escrito também. 😀
(agora 48 kg, mas tenho treinado muito em árias puericulturais)
:))) adorava ter visto.
e já estou como o Eufigénio: 47 kgs de voz????
dasse!!
aNa, digamos que em almoços de família, quando as pessoas estão espalhadas por vários hectares de campo, sou sempre chamada a chamar por elas…MÊÊÊÊÊSAAAAAAAAAAA! TÁ O ALMOÇO NA MESA HÁ HÓÓÓÓÓÓRAS!
Mulher de tomates! Eu não tinha coragem para fazer isso… boa!
Lei dos salvados!? Companhias de seguros… barões.
ai, catarina, cada vez gosto mais de ti!!!
(comentário sem carga erótica porque sou uma mulher bem casada!!)
47 kg de voz em 1.60 de altura de….uma “ganda mElher” !
Olaré!
Tu a mim nunca me enganaste, Catarina.
Repito…”ganda mElher”!
(Deve ser do nome…lol)
Até parece que já te estou a imaginar em plena Carcavelos (é muito mais in que Ipanema, desculpa lá):
“Quantos são? Quantos são? VenhEm eles, qu’eu vou-me a eles!
Deslarguem-me!”
lol..ok…eu calo-me… 😉
Bjs.
Batatas, eu não lhe chamaria tomates. Para ser honesta creio que foi pura fúria, absolutamente inconsciente, totalmente reactiva: repara que eu até tinha o dinheiro do assalto comigo, para o caso de ser assaltada, estava farta de ouvir histórias, sei que nestes casos se fica quieto para não acontecer nada pior e fiz exactamente o oposto sem pensar. Acho que as pessoas só sabem como reagem nestas situações quando passam por elas. Não foi coragem, foi alucinação.
Ah! Esses barões.
(nunca consideraria um comentário desses com qualquer carga erótica, vindo de quem viesse, aNa. :))
Kooka, não sei…é o pior. Acho que já não faria outra destas, mas não sei mesmo! Este tipo de fúrias são incontroláveis: mas te digo que se tocassem num cabelinho de uma certa criança acho que me ia a eles aos tiros.
Catarina, eu entendo o que queres dizer e entendo que se calhar não farias outra.
Mas é impossível, depois de ler o teu relato, não te imaginar no pseudo-arrastão-que-já-ninguém-sabe-se-o-foi-ou-não.
Diria que são pelo menos 60 kg de voz. mas resta dizer que isso também acontece porque tu és a única que não está espalhada por vários hectares de campo.
Kooka, não sei mesmo (e não me apetece saber). Quanto ao arrastão, ainda bem que não gosto de praia.
Mana, tás aí a fazer o quê? Olha não te atrases mazé! :DDD (de saída right now)
Há alguma hipótese de se arranjar
“MÊÊÊÊÊSAAAAAAAAAAA! TÁ O ALMOÇO NA MESA HÁ HÓÓÓÓÓÓRAS!”
em cassete? Dava tanto jeito para chamar o meu pai…
Pincipalmente pelo teu feitio…
😉
Dasse…. tu ainda vais ser contratada para Conselheira de Técnicas e Estratégias Dissuassoras da Polícia…
cum caraças!!!
1,60m, 47 kg (agora 48 mas em treinos) e a voz a ouvir-se de Ipanema a S. Conrado??? ahahahhaah Catarina, tu não existes! Vê lá tu que até os ladrões te acharam piada :P.
Olha tiveste mais sorte que eu, que da única vez que fui assaltada levei porrada até ao tutano (mesmo até ao tutano, de modo a ir para o hospital fazer o Rx ao cérebro…). E sim, também era preto.
A revista Veja publicou uma vez uma reportagem sobre o perfil do assaltado, ou seja: quem é que os ladrões preferem roubar.
E sabem que diziam os manfios lá do Brasil? Que o que mais detestavam era assaltar mulheres. Porque nunca sabiam que reacção elas iam ter…. Esses que se meteram contigo, Catarina (e a não ser que não tenha lido bem não foi mencionada cor de pele, porque de facto n interessa para nada, roubo é roubo, ponto final), não lêem revistas ou então eram novatos…
PS: Uma vez, uma amiga minha e a prima iam às 11 da noite na Colina do Sol quando um bando de seis ou sete gajos passou por elas e as apalpou. Os gajos eram grandes, tinham mau aspecto, era de noite, mas a prima desatou a correr atrás deles a distribuir pontapé e canelada e a chamar-lhes todos os nomes possíveis. Final da história: os gajos fugiram a sete pés. A minha amiga ficou petrificada.
Não consigo parar de rir. Dá me 1 segundo…
É pá… muito bom