A descampanha eleitoral
ou então é de mim.
Nunca na vida me desinteressei tão activamente por uma campanha eleitoral. Não tenho a mais pequena paciência, mesmo havendo alguma dúvida quanto ao resultado. Acho-os todos fracos, muito faladores e pouco convincentes e já desliguei. Como o voto é secreto, para mim o meu também será até chegar ao cubículo de caneta e boletim na mão. E depois, logo se verá.
Gosto de alimentar, de vez em quando, algumas alucinações políticas, que, se tivesse tempo e paciência (e algumas coroas a mais), acharia imensa piada levar para a frente. Uma delas era fundar um partido que se chamaria
Legalize!
até porque sou completamente isenta no assunto. Opções minhas que não interessam minimamente, mas que não retiram em nada a minha posição sobre o assunto. Legalize.
O Legalize! seria um partido de gente um tudo nada alucinada, um tudo nada ganzada (tinha de ser por uma questão de coerência) e um tudo nada um bocadinho off das grandes questões. Gente que beijaria na maior as peixeiras, as tias das peixeiras, as netas das peixeiras, os talhantes (sim, esses desgraçados ignorados, sempre postos de lado nas campanhas eleitorais, não se sabe porquê, mas talvez por não gostarem de ser beijados pelos políticos e as senhoras políticas serem uma cambada de coiros que ninguém, no seu juízo perfeito, gostaria de beijar, tirando, evidentemente, a família e amigos), os tios dos talhantes, os netos dos talhantes, enfim, a lista toda do pequeno comércio, das grandes empresas, clero, burguesia, nobreza e do povo em geral, o Legalize! faria da beijoca entusiasmada o seu braço levantado.
Nas grandes questões, desde as entrevistas cujas perguntas são enviadas previamente aos entrevistados para que um batalhão de criaturas as possam respoder em condições (?) até aos gaguejados debates televisivos, o Legalize! teria sempre uma série de respostas
prontas, decisivas e totalmente abrangentes.
– Ora, então o vosso partido em relação à política externa…
– Somos a favor.
– Mas a favor de…?
– A favor, pá.
– Mas expecificando…
– Pá, não compliques. Somos a favor e mai nada.
– Ora então o vosso partido em relação à questão dos lixos…
– Somos a favor.
– Mas a favor de…?
– A favor, pá.
– Mas expecif..
– Pá. Não compliques. Somos a favor que se resolva.
– Mas que se resolva o quê exactamente?
– Que se resolva a questão dos lixos, claro.
– A privatização dos hospitais públicos…
– Pá. Não compliques. Se são públicos não são privados, tazaver?
– E a vossa posição na legalização das…
– Legalize!
– ..ia a dizer das putas…
– Legalize também!
—
Mas, outras vezes, penso:
– será mesmo preciso (mais) um partido assim???
- Desato a rir…
- A lógica da irracionalidade